Zemaria Pinto
Janaína de todos os nomes
Envelhecer limita-se com
apodrecer. Os lapsos de memória, as dores nunca sentidas, as referências
perdidas: a vida reduz-se a lembranças improváveis, sem nenhuma ordem, e nos
deixamos levar, sem mensurar as perdas, submetidos e submissos. Os nomes se embaralham,
as situações também. Celebro o vazio, quando deveria recordar as mulheres que
preencheram minha vida, esse oco sem conexão com os fatos, rostos que são
apenas uma mancha disforme, mãos que se tornam garras quando delas me acerco,
nomes sem sentido. Não há música possível, apenas o choro monocórdio dos corpos lacerados – não há sensualidade no sangue coagulado. Dão-me algo para beber.
Lentamente, as ideias se arrumam e as imagens formam algum nexo. O corpo nu à
minha frente é o da índia Janaína, exatamente como a vi adormecida milhares de
vezes, deitada sobre o braço direito, o esquerdo projetado para a frente, o
seio à mostra e a bunda à minha espera. Valda e Vilma, as irmãs ninfomaníacas,
me puxam para si e me machucam os testículos. Regina, Vera, Cleide e Márcia me
mordem o corpo que já não reage. Fabiana, a cleptomaníaca, Solange, Helen,
Catarina – suas mãos em mim não me tocam, passando como névoa pelo meu corpo
enrijecido. Os lábios proibidos de Rose roçam meus lábios e seu hálito é
gelado. Cida me amassa os músculos das costas, Ane sussurra uma oração sem
sentido e Renata me olha com olhos baços. Shirley bate no meu rosto e fala
palavrões que não escuto. Janaína flutua ao meu encontro, deita-se com
suavidade sobre mim, o seu corpo inteiro me cobre, me protege. Falando numa
língua que eu não compreendo, ela me lambe com bondade e afeto – o rosto, o
torso, os mamilos – e eu me esqueço de mim.
*Fim de Lábios que beijei*