Amigos do Fingidor

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Beiradão, beirada, beira de rio

 Pedro Lucas Lindoso

 

Recebo e-mail do meu amigo e irmão Dr. Antônio Loureiro, nos lembrando que os meninos e meninas de nosso tempo ouviram muitas vezes, como cantiga de ninar:

“Murucututu da beira do rio. / Murucututu da beira do rio. /Quando sapo canta, ô maninha / É porque tem frio.” Ou ainda: “Murucututu de cima do telhado. / Murucututu de cima do telhado. / Vem pegar este menino, / Que ainda está acordado.” Esta versão, possivelmente mais urbana e diversificada,  é de fazer qualquer curumim  morrer de medo e pegar logo no sono.

De acordo com Dr. Loureiro, as crianças do alto Rio Negro ainda ouvem e cantam assim. Não é mágico?

Murucututu é o nome de uma coruja bem pequena. Para alguns ela traz sorte.  Reza  a lenda, de  origem indígena, que Murucututu seria a mãe do sono. Seu papel é fazer adormecer as crianças que demoram a dormir. A lenda diz ainda que Murucututu “empresta” o sono para as crianças.

Muito conhecida também é a música da Cuca: “Nana neném que a Cuca vem pegar / Papai foi para roça / Mamãe foi trabalhar.” Mas não é tão amazônica como a nossa Murucututu. É mais do Sul/Sudeste. Mesmo porque temos poucas “roças” por aqui. Planta-se nas várzeas e igapós.

Ah! Sim! Temos a beira do rio. A beirada, os beiradões. Um dos clássicos de nossa literatura amazonense é o livro Beiradão, de Álvaro Maia, poeta e escritor. Álvaro Maia foi governador e senador por nosso Amazonas. Nessa obra, relata fatos e personagens das beiradas do Rio Madeira, onde nasceu. O beiradão, a beirada, a beira do rio é onde habitam as murucututus.

O beiradão é tão marcante, tão importante, que virou gênero musical. Virou um ritmo típico das beiradas, das beiras dos rios. O beiradão é expressão cultural diversificada. Envolve também dança e festas às margens dos rios. Onde moram as murucututus, claro.

Ah! Mas as coisas mudam! Há uma nova versão para a música do murucututu. Substituíram o mucucututu pelo Sapo Cururu. Que também mora na beira do rio e tem até mulher.

“Sapo cururu da beira do rio / Quando o sapo canta, ô maninha / É porque faz frio. / A mulher do sapo / Deve estar lá dentro, / Fazendo rendinha, ô maninha, / Para o casamento.”

Não é só isso. Agora chamam os beiradões, as beiradas, a beira do rio de orla! Eu até concordo que o sapo cururu possa morar na beira do rio, como a murucututu. Agora, chamar beira de rio de orla!... É muita pavulagem!