Pedro Lucas Lindoso
Numa
época em que há uma preocupação, às vezes exagerada, em ser politicamente
correto, tenho observado as letras de cantigas para criancinhas. Algumas, de
fato, são dramáticas. Outras chegam a ser um tanto quanto catastróficas. Muitas
metem medo. Todos nós, contudo, sobrevivemos a tudo isso sem maiores traumas.
Vejamos
algumas delas. Numa famosa cantiga o cravo briga com a rosa, debaixo de uma
sacada. Sai ferido e a rosa despedaçada. Depois ficou doente e teve um desmaio.
A rosa pôs-se a chorar. Que drama!
Há uma
outra em que Samba Lelê fica doente, com a cabeça quebrada e ainda leva umas
boas palmadas. Chega-se a ficar com pena da pobre Samba Lelê.
Nesse
interim, um soldado com cabeça de papel marchava enquanto o quartel pegava
fogo. Alguém ia ao Tororó beber água e não achava. Nessa confusão toda, a canoa
virou. Por causa da Maria que não soube remar. E sempre tem boi na linha ou nas
músicas.
Os bois
quando não têm cara preta para assustar a meninada, resolvem morrer. O boi morreu
e mandaram buscar outro no Piauí!
Será
que o Piauí também é a terra do Tutu Marambá? Ser perigosíssimo a ponto de
fazer qualquer pai um homicida. Que ele não venha mais cá, senão o pai do
menino manda matá-lo. E por falar em seres que metem medo, não há ninguém mais
famoso que uma tal de Cuca. Durma neném,
senão a Cuca logo vem. E o Bicho papão? Esse aí, então! Fica em cima do
telhado. E não deixa o menino dormir sossegado. Com certeza!
Quem
acha que a “música sertaneja de sofrência” é coisa da atualidade está muito
engando. Vejam só a letra da famosa Ciranda Cirandinha: Ciranda, cirandinha
vamos todos cirandar! /Vamos dar a meia volta / Volta e meia vamos dar. / O
anel que tu me deste /Era vidro e se quebrou /O amor que tu me tinhas / Era
pouco e se acabou.
Talvez
a mais dramática e insensível dessas músicas seja o “Pau no gato”. Pode o berro
do gato taxar essas canções de politicamente incorretas? O termo é usado para
evitar uso de expressões consideradas excludentes, preconceituosas ou ofensivas
a grupos considerados desfavorecidos. Não é o caso dessas cantigas populares.
Há quem advogue mudar a letra de algumas dessas músicas. Não concordo. Outros acham que se pode usar rock, pagode ou
sertanejo em festa junina. Bobagem. Vamos respeitar as tradições.