Amigos do Fingidor

terça-feira, 4 de julho de 2023

Respeitando as tradições

Pedro Lucas Lindoso

 

Numa época em que há uma preocupação, às vezes exagerada, em ser politicamente correto, tenho observado as letras de cantigas para criancinhas. Algumas, de fato, são dramáticas. Outras chegam a ser um tanto quanto catastróficas. Muitas metem medo. Todos nós, contudo, sobrevivemos a tudo isso sem maiores traumas.

Vejamos algumas delas. Numa famosa cantiga o cravo briga com a rosa, debaixo de uma sacada. Sai ferido e a rosa despedaçada. Depois ficou doente e teve um desmaio. A rosa pôs-se a chorar. Que drama!

Há uma outra em que Samba Lelê fica doente, com a cabeça quebrada e ainda leva umas boas palmadas. Chega-se a ficar com pena da pobre Samba Lelê.

Nesse interim, um soldado com cabeça de papel marchava enquanto o quartel pegava fogo. Alguém ia ao Tororó beber água e não achava. Nessa confusão toda, a canoa virou. Por causa da Maria que não soube remar. E sempre tem boi na linha ou nas músicas.

Os bois quando não têm cara preta para assustar a meninada, resolvem morrer. O boi morreu e mandaram buscar outro no Piauí!

Será que o Piauí também é a terra do Tutu Marambá? Ser perigosíssimo a ponto de fazer qualquer pai um homicida. Que ele não venha mais cá, senão o pai do menino manda matá-lo. E por falar em seres que metem medo, não há ninguém mais famoso que uma tal de Cuca.  Durma neném, senão a Cuca logo vem. E o Bicho papão? Esse aí, então! Fica em cima do telhado. E não deixa o menino dormir sossegado. Com certeza!

Quem acha que a “música sertaneja de sofrência” é coisa da atualidade está muito engando. Vejam só a letra da famosa Ciranda Cirandinha: Ciranda, cirandinha vamos todos cirandar! /Vamos dar a meia volta / Volta e meia vamos dar. / O anel que tu me deste /Era vidro e se quebrou /O amor que tu me tinhas / Era pouco e se acabou.

Talvez a mais dramática e insensível dessas músicas seja o “Pau no gato”. Pode o berro do gato taxar essas canções de politicamente incorretas? O termo é usado para evitar uso de expressões consideradas excludentes, preconceituosas ou ofensivas a grupos considerados desfavorecidos. Não é o caso dessas cantigas populares. Há quem advogue mudar a letra de algumas dessas músicas. Não concordo.  Outros acham que se pode usar rock, pagode ou sertanejo em festa junina. Bobagem. Vamos respeitar as tradições.