Amigos do Fingidor

quinta-feira, 14 de março de 2024

A poesia é necessária?

 

O mundo necessita de poesia


Gilka Machado (1893-1980)

 


O mundo necessita de poesia,

cantemos, poetas, para a humanidade;

que nossa voz suba aos arranha-céus

e desça aos subterrâneos,

acompanhando ricos e pobres

nos atropelos

das carreiras

de ambição

e na luta pelo pão.

 

Lavemo-nos das máscaras histriônicas;

tenhamos a coragem

de propalar a existência eterna

do sentimento;

ponhamos termo

a esses malabarismos

de palhaços

falsos

da modernidade,

permanecendo diferentes,

diante da multidão

insensibilizada,

enferma.

 

A humanidade quer rir de tudo,

porém é alvar sua gargalhada.

Foge das tristezas,

mas paira ausente

em meio aos prazeres,

desligada em toda parte,

perdida em si mesma.

O homem anda esquecido do caminho da fé

que a poesia sempre lhe ensinou.

O homem está inquieto

porque lhe falta a posse das distâncias

que só a poesia proporciona.

O homem se sente miserável

porque a poesia não lhe enche a alma

daquele ouro inesgotável

do sonho.

 

O mundo necessita de poesia,

(não importem assuadas)

cantemos alto, poetas, cantemos!

Que seja nossa voz

um sino de cristal,

um sino-guia de perdidos rumos,

vibrando no nevoeiro de inconsciência

do momento angustioso!

 

Nosso destino, poetas, é o destino

das cigarras e dos pássaros:

– cantar diante da vida,

cantar

para animar

o labor do Universo;

cantar para acordar

ideias e emoções;

porque no nosso canto

há um trigo louro,

um pão estranho que impulsiona

o braço humano,

e os cérebros orienta,

uma hóstia

em que os espíritos encontram,

na comunhão da beleza,

a sublimação da existência.

O mundo necessita de poesia,

cantemos alto, poetas, cantemos!