Amigos do Fingidor

terça-feira, 19 de março de 2024

Belém, Belém, nunca mais fico de bem!

Pedro Lucas Lindoso

 

Não sei como a meninada se comporta nos dias de hoje. As amizades infantis da minha infância tinham um código lúdico bem peculiar. Alguém ficava magoado e chateado. Era preciso saber se a amizade ainda persistiria ao entrevero. Juntava-se os dois dedos indicadores e perguntava-se: corta aqui? Se o outro cortasse era porque a amizade havia acabado!

Então dizia-se que fulano havia ficado “de mal” com o outro. Essa técnica também era válida entre irmãos.  Minha mãe, quando ouvia dizer que alguém estava “de mal” com outro, era taxativa:

– Podem parar com essa estória de ficar “de mal”. Tratem logo de fazer as pazes.

Outra técnica consistia em mostrar ao outro os dedos mínimo e indicador. Dedos esses conhecidos também como mindinho e fura bolo. Mandava-se escolher: Esse é o mal e esse é o bem. Se o mindinho fosse apontado, estavam “de bem”. O pedido de desculpas estava implícito e estava tudo certo.

Mas, se a escolha fosse pelo indicador, estavam “de mal”. E poderia ainda se ouvir: Belém, Belém, nunca mais fico de bem!

Recebo a visita de meu amigo Dr. Chaguinhas. Estava preocupado com sua filha. A garota, de dezesseis anos, namorou um rapaz por quase um ano. De repente, sem mais nem menos, o rapaz sumiu.

Estranhamente deixou de responder às mensagens de WhatsApp. Saiu dos grupos em que a garota e ele participavam. Não atendia mais às ligações da namorada. Saiu do Instagram e do Facebook.

Chaguinhas perguntou pelo rapaz e a filha caiu no choro! Preocupados, os pais foram conversar com a menina. Ela relatou que não havia feito nada de mais com o rapaz. Não estavam se relacionando sexualmente. Estava tudo bem no namoro. Mas simplesmente o rapaz sumiu de seus contatos no celular.

Chaguinhas e a esposa tentaram entrar em contato com os pais do rapaz. Tudo bem que o namoro terminasse. Mas de forma civilizada. Sem sucesso. Os poucos amigos em comum do casalzinho não sabiam dele. Aliás, eram amigos da garota. E todos achavam tudo muito estranho. Uma coleguinha disse ter visto o rapaz no shopping. E que ele fingiu não a conhecer. A garota, muito tristinha e abalada, foi levada ao psicólogo. O diagnóstico foi de que a menina tinha sido vítima de “ghosting”. O termo “ghosting”, vem da palavra ghost (fantasma, em inglês). Se popularizou por definir o desaparecimento em relacionamentos, principalmente nas redes sociais.

Ora, o afastamento sempre deve ser comunicado. Essa comunicação deve ser direta, fluida e assertiva, como a meninada da minha infância: Belém, Belém, nunca mais fico de bem!