Pedro Lucas Lindoso
Um dos
mais icônicos móveis que havia na casa de minha avó era o petisqueiro. Não
confundir petisqueiro com petisqueira. Petisqueiras são bandejas próprias para
servir petiscos. Normalmente, são grandes pratos com divisórias. Em cada
divisória se serve um petisco diferente tais como azeitonas, amendoins ou
castanhas, salgadinhos e que tais.
O
petisqueiro não é isso! O petisqueiro é um móvel. Um armário onde se guardavam
viandas, quitutes, guloseimas, biscoitos, frutas e quitandas em geral. Em Minas
Gerais e em Brasília usa-se muito a palavra quitandas. Quitandas no sentido de pastelaria e salgados
caseiros.
Para
nós, amazonenses, quitanda é o local ou estabelecimento onde se vendem legumes,
verduras, ovos, galinhas, carvão etc.
Minha mãe era freguesa de uma quitanda bem sortida na avenida Joaquim
Nabuco. Isso nos anos de 1960 do século passado.
Mas
voltemos ao petisqueiro. Em alguns locais é conhecido como guarda-comida. Os
petisqueiros saíram de moda ou perderam sua utilidade, acredito eu, com a
chegada das geladeiras. Sem querer ser saudosista. Uma pena!
Os
petisqueiros eram móveis repletos de magia para muitos meninos e meninas. Pelo
menos foi para mim. Em especial o petisqueiro que tinha na casa de minha avó.
Magia esta que a geladeira não tem. E nunca terá.
O
petisqueiro de minha avó tinha um delicioso cheiro de abricot. Ou abricó.
Possivelmente a fruta favorita de minha vozinha. Abricó da Amazônia, também
conhecido como abricó-selvagem, é uma árvore que atinge mais ou menos seus
vinte metros de altura. Seu tronco é curto e bastante grosso. O fruto, o
gostoso abricó, é uma baga, como dizem os botânicos. Carnoso e sumarento.
Além de
abricós, guardavam-se mangas e jambos. Todos do grande quintal da chácara da
então Vila Municipal. Havia ainda um pequeno estojo de porcelana azul. Vovó
guardava ali seu dinheirinho proveniente da venda de frutas, principalmente de
mangas. Ela as vendia escondido. Não precisava daquilo. Mas não abria mão. No
petisqueiro também escondia cigarros. Outra coisa que ela fazia escondido era
fumar. Eu era seu cúmplice.
No
petisqueiro também se guardavam velas e uma caixa de fósforos. Usados para
quando faltava energia. E também um baralho. Uma das distrações de vovó era
jogar paciência. Um certo jogo de cartas também conhecido como solitário. Encontrado
frequentemente nos computadores. Aprendi a usar o mouse jogando paciência no
computador. Só lembrava de minha avó.
Oura
coisa que tinha no petisqueiro era incenso. Desses, do tipo indiano, com cheiro
de sândalo. Conclui-se que o petisqueiro de minha avó já tinha extrapolado
mesmo a sua antiga função de guarda-comida. Mas, além das frutas, o petisqueiro
ainda era lugar de se guardar bolos e sucrilhos.
A casa de minha avó não existe mais. O
petisqueiro desapareceu. Mas o cheiro do abricó continua vivo na memória
daquele menino.