Amigos do Fingidor

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Os exílios do homem

Jorge Tufic

Clivar um soneto ou um poema do grande poeta cearense Francisco Carvalho (grande porque autor de 24 livros, todos merecedores de louvação e carinho), seria o mesmo que reverter o espetáculo da unidade aos fragmentos que se transformam, por sua vez, em milhares de outras unidades poéticas, tal como se concebe a explosão de um cristal uniforme ou de uma galáxia madura. O mistério ou o segredo deste fenômeno consiste, para mim, na propriedade, já solidificada, de um léxico próprio que detona os signos míticos responsáveis pelo volume, jamais repetitivo, da obra em apreço, sem que nada venha indicar que o poeta esteja cansado ou menos disposto aos convites do plectro.

Em respaldo ao que afirmo, Os exílios do homem, que emplaca exatamente o 24º de sua obra, ilumina-se, com algumas variações, dos mesmos índices constantes dos livros anteriores: “parábola”, “réquiem”, “pedra”, “medula”, “tempo”, “candeia”, “holocausto”, “rebanho”, “centauro”, “clepsidra”, “harpa”, “chama”, “zodíaco”, “orgasmo”, “abutre”, “infância”, “alaúde”, “gorjeio”, “espiga” etc. etc., particularmente aqueles que integram a “individualidade” marcante do autor, a exemplo de “antúrio”, “purgatório” e “túnica”, inclusive mitos gregos e referências a passagens bíblicas de conteúdo profético.

Esta última conquista de sua estante sempre vígile ao “gotejar dos minutos”, posto que sólida e perene, acha-se dividida em duas partes – a primeira, contendo 64 poemas, e a segunda, dez (X) miniaturas; ou seja, em minha fraca opinião, temas ou segmentos de estatura épica resumidos em poucas estrofes de aconchego lírico. Resgates, momentos-monumentos, lembranças da infância, réquiens, a humanização da paisagem geográfica, o ciclo vital, os presságios, a onipresença da amada, as horas domésticas, habitat fictício, o pasto, o brinde solitário, a morte, o êxtase, as ruínas, o vento, a chuva e o perfil dos retratos da antessala perempta, continuam presentes neste livro de Francisco Carvalho. As quadras, o dístico, o terceto, entre várias outras composições de pequeno porte, contudo, lhe imprimem a totalidade uníssona de uma partitura que tivesse como orquestra a um sucinto vocabulário de triunfos e demolições. O enigma da vida e da morte pendula, aqui, entre o sarcasmo e a perplexidade.