Amigos do Fingidor

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Curso de Arte Poética

Jorge Tufic
 
II.3.3 - A RIMA


                   As rimas podem ser classificadas em vários tipos:  

·        leonina; ela ocorre quando tônica, que marca a cesura mais forte, dividindo o verso em dois segmentos ou hemistíquios, coincide por identidade tonal com a tônica da palavra final do verso: “por não nos maguarmos ou mudarmos” (idem);  

·        grave; também chamadas FEMININAS ou PAROXÍTONAS. São rimas com palavras acentuadas na penúltima sílaba, como no seguinte exemplo que nos dá Geir Campos:
 

O que me espanta na vida,

a que nunca foi vivida,

não é sabê-la perdida.

         É ver que tudo vem dela:

         vive nela.

                              (Emílio Moura)      


·        pobre; rima com palavras da mesma categoria gramatical, substantivo com substantivo, advérbio de modo com advérbio de modo, verbo com verbo na mesma pessoa e tempo, e daí por diante (idem). Ex: “silêncio agora mais fundo/dorme num sono profundo”;  

·        rima rica é a rima com palavras de categoria gramatical diferente, de substantivo com adjetivo, verbo ou advérbio: “Azul celeste à parede/Sobre o papel que a reveste... E é toda a câmara, vede,/Azul celeste”;  

·        rima toante; é a rima que apresenta semelhanças apenas de vogais; chama-se toante, assoante, imperfeita ou parcial: “Ai, flores, ai flores do verde pino/se sabedes novas do meu amigo?”;  

·        rimas consoantes; soantes, perfeitas ou totais; rima com identidade de tom na sílaba tônica e na articulação consonantal da sílaba seguinte, sem no entanto ser idêntica a sílaba de apoio da tônica: “Nasceu pelos calores de janeiro/Às três da madrugada.../E foi ele o primeiro” (Mário Pederneiras, ct.por Raul Xavier)  

·        rimas perfeitas; rimas de palavras com identidade fonética na sílaba tônica e na estrutura consonantal das sílabas subsequentes: “Deixava a pátria e verdade/Ia morrer de saudade” (ib);  

·        rimas imperfeitas; é o caso ao inverso, como se lê em Arthur Azevedo: “É caso decidido os doutro sexo:/Não têm, não podem ter na casa ingresso”;  

·        rima anagramática; rima com palavras cuja sílaba tônica é idêntica, sendo, no entanto, diversa a estrutura silábica: lava, alva; dona, onda; 

·        rimas intercaladas; são as rimas que intercalam uma unidade rítmica em outra, segundo a estrutura abba   bccb   cddc, etc. Ex: agas/endo/endo/agas;  

·        rimas internas; são as rimas feitas entre palavras dentro dos versos, como neste exemplo do “Livro de Sonetos” de Jorge de Lima: “Olhos, olhos de boi  pendidos vertem/prantos por quem se foi. Ouvidos ouvem,/calam. Crepes enlutam as janelas./Fundas ouças escutam seus gemidos”;  

·        rimas cruzadas; as que se distribuem de forma alternada, uma a uma, conforme a estrutura abab (NNC, obra cit.); 

·        rima peregrina; rima com palavras raras ou de uso invulgar, como marulhos com tortulhos ou pântanos com espanta-nos, etc;  

·        rima equívoca; é a rima com palavras homônimas, homógrafas, homófonas, que variam de categoria gramatical, por metassemia ou mudança de significação: “Chegada a frota ao rico senhorio/Um português mandado logo parte/A fazer sabedor o rei gentio/Da vinda sua a tão remota parte” (Camões), (RX, obra cit.); 

·        rimas exóticas; são rimas com palavras de idioma estrangeiro;  

·        rima erudita; rima com termo do vocabulário científico, filosófico ou de língua morta (idem). Augusto dos Anjos pode servir como exemplo. 

                   É bastante extensa, porém, a nomenclatura da Rima, com seus desdobramentos e novidades. Sua “história”, inclusive, desperta o maior interesse quando ficamos sabendo que os poetas gregos e latinos demonstravam ser a rima dispensável ao poema e poemeto, em sua condição de obra de arte feita com palavras. “A rima – esclarece Raul Xavier – teve sua origem em um complexo processo linguístico, que se processou desde o primário processo de emissão oral dos fonemas, até os da sensibilidade estética e intelecção com objetivos sócio-culturais” (...) “A intenção de exprimir, salientar prosodicamente um motivo, não estaria divorciada das vozes fonossimbólicas. No latim, observa ainda Marouzeau, “a pouca variedade de desinências nominais e verbais implicava em algo de monotonia”. O mesmo latinista assinala que a ocorrência do homeoteleuten no final dos membros simétricos toma o aspecto de rima, sendo esta um dos elementos do carmen, acrescentando: “Como o hometeoteleuton, muitas vezes combinada com ele, a rima redobrada confere ao enunciado tal valor que ela se encontra, particularmente nos poetas e sobretudo em composições que tenham de produzir certos efeitos.”

                   Tal como as espécies literárias do gênero Poesia, o elenco da Rima, por sua vez, mobiliza um número considerável de denominações relativas aos seus diversos manejos: Alguns exemplos apenas: ACATALÉTICA - com palavras paroxítonas; AGUDA - com vocábulos oxítonos ou monossilábicos; ALEIJADA, ALITERADA, ALOFÔNICA, AMPLIFICADA, ANTITÉTICA, ARCAICA, ARTIFICIAL, ASSOANTE, BARÍTONA, BISESDRÚXULA, CAUDADA, COMPLETA, CONSOANTE, CONSONÂNTICA, CONTINUADA, COROADA, CRUZADA, DATÍLICA, DERIVADA, DISSILÁBICA, DISTANTE, ECOANTE, EM ECO, EMPARELHADA, ENCADEADA, ENTRELAÇADA, EQUÍVOCA, ERUDITA, EXÓTICA, EXPLETIVA, EXTERNA, FALHA, FECHADA, FEMININA, FIGURADA, FONÊMICA, GEMINADA, GRAVE, IÂMBICA, ÍMPAR, ISOSSILÁBICA, LEONINA, etc. etc. etc.

                   Os “Dicionários de Rimas”, a exemplo do que citamos alhures, costumam esmerar-se pela riqueza de informação e excelente metodologia, para o bom desempenho da consulta. Começam, portanto, com substantivos monossilábicos: À, chá, fá, K, lá, pá, pá, Sá, xá; e vão, num crescendo: dissílabos, trissílabos, quadrissílabos e daí para os verbos, substantivos, adjetivos, etc. Vale a pena ter um, para os momentos de maior dificuldade. A sugestão é válida, pois somente assim é possível verificar a fertilidade de vocábulos, por exemplo, terminados em ia, im, osa, or, entre muitos outros.