Zemaria Pinto
Janaína
Janaína
Minha
vida amorosa já entrava em declínio quando conheci a índia Janaína, plena de
frescor, vivacidade e doçura. Janaína jamais me pediu nada e o pouco que lhe
dei nada representava diante do que recebi. Éramos muito diferentes – ela,
vegetariana, sensível, a delicadeza personificada, falando de arte e poesia;
eu, que só aprendi a falar em dinheiro e tinha os sentidos ligados no imediato,
emudecia e às vezes adormecia. Viajamos muito. Ela conhecia quadros, museus,
lugares, tipos de vinhos, mesmo sem nunca ter estado ali antes – e falava muito
sobre. Brigamos muito também: várias vezes nos separamos, quase sempre, por
bobagem. Eu ia atrás dela, fazia promessas, e ela acabava voltando. Sabedora do
meu passado de amores tortuosos, dizia-se agradecida por me manter fiel a ela.
Mas isso não era verdade: de vez em quando, eu ia ao centro de massagem, só
para não perder o hábito, além de um ou outro caso ocasional ou nem tanto. Eu
não podia achar que aquilo fosse para sempre. Janaína era uma dádiva, que, eu
sabia, mais cedo ou mais tarde, iria perder de vez. Apesar da gangorra,
tínhamos uma vida plena de alegria. Tomávamos vinho e dançávamos músicas de um
tempo em que a mãe dela ainda nem havia nascido. E nos amávamos gostoso. Com o
tempo, Janaína, amadurecida e senhora de seu prazer, já não pedia sexo como no
início. Quando acontecia, ela se iluminava. Se não acontecesse, ela continuava
com seu sorriso largo e seu jeito brando e delicado de ser. Na véspera do meu
aniversário de 60 anos, nos amamos como não acontecia havia anos – e ela disse
que aquele era o seu presente. Já ia alta a madrugada quando adormeci. Pela
manhã, um bilhete na mesinha da sala, a tinta borrada, o perfume dela ainda no
ar – e mais nada.