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quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Aborto como método anticoncepcional: tragédia social dos pobres 1/3


João Bosco Botelho


No cotidiano das maternidades públicas, em Manaus, ocorrem atendimentos de dezenas de mulheres grávidas, no primeiro trimestre, em trabalho de aborto incompleto, a maior parte provocado pelo uso oral de substâncias químicas ou pelo manuseio criminoso da cavidade uterina. Essas mulheres chegam aos hospitais com hemorragia e infecção, algumas em risco de vida. Todas são submetidas às curetagens uterinas salvadoras! A quase totalidade tem pouca escolaridade, mora na periferia urbana e em favelas.
As informações do DATASUS são impressionantes! Em algumas maternidades são realizadas mais curetagens para do que partos. O estudo realizado pelo Instituto do Coração evidenciou, entre 1995 e 2007, que a curetagem uterina pós-aborto aparece como a cirurgia mais realizada no Sistema Único de Saúde (SUS). Os números mostram a gravidade do problema de saúde pública: em 2015, 181 mil; em 2014, 187 mil e em 2013, 190 mil.
As estatísticas dos abortos provocados, no mundo, mostra com clareza aproximadamente 97 países, cerca de 66% da população mundial, que têm leis permissivas ao aborto como método anticoncepcional, até determinada idade fetal; em outros 93 países, em torno de 34% da população, só é permitido o aborto apenas em situações especiais como má formações congênitas comprometendo a vida fetal, estupro e risco de vida para a mãe.
Nos países, onde o aborto como método anticoncepcional é permitido e amparado pelo Estado, as leis autorizam a interrupção da gravidez variando entre 10 semanas, na França, desde 1975, até 28 semanas, na Inglaterra, desde 1967.
A difícil análise dos abortos provocados como método anticoncepcional, nos países tropicais, poderia iniciar com a pergunta: o que se mostra tão sedutor a essas mulheres, capaz de lhes dar força para tomar uma atitude capaz de provocar sequelas definitivas e a morte?
Dessa forma, tentar reduzir o problema aos limites socioeconômicos não é suficiente para explicar porque, ao longo de muito tempo, em diferentes culturas, certas mulheres arriscam a vida para interromper a gravidez não desejada. Os registros informam que o aborto nunca deixou de ser realizado nos quatro cantos do planeta, contudo sob diferentes interdições.
Não existem citações ao aborto provocado tanto no código de Hammurabi, do século 17 a.C., quanto nas leis de Eshnunna (1825 a 1787 a.C.), dois dos mais severos conjuntos de leis, no escravismo politeísta, que englobavam muitos aspectos da vida social, inclusive o erro médico.
Na Grécia antiga, do século 4, o juramento de Hipócrates, oferece, num primeiro momento, a clara tendência antiabortiva dos médicos gregos, da Escolas de Cós, onde se localizava o hospital-escola de Epidauro: "...Não darei venenos mortais a ninguém, mesmo que seja instado, nem darei a ninguém tal conselho e, igualmente, não darei às mulheres pessário para provocar aborto...". Outra abordagem dos princípios éticos hipocráticos aponta a valorização primordial da vida; logo, a proibição ao aborto e outras cirurgias se assentava no fato de que as complicações poderiam causar a morte da grávida. Sob esse argumento, a interdição ao aborto provocado, no juramento hipocrático, longe de representar impedimento de natureza moral do ato abortivo em si mesmo, esta atada à decisão fundamental do médico grego em manter a vida da paciente.