Pedro Lucas Lindoso
Maués não gosta do Natal. No seu registro de nascimento
consta que seu nome é Jesus. Como nasceu dia 25 de dezembro, convenceram seu
pai a registrá-lo homenageando o Nosso Salvador. O grande aniversariante do
dia. Mas Maués acha que não merece esse nome. Além disso, seu pai queria
batizá-lo como Maués, Município onde se localizava a tribo indígena onde seu
pai nasceu. E pede que o chamem de Maués.
A tribo não mais existe. Alguns dos parentes de seu pai se
tornaram índios urbanos e moram em Manaus. Outros, como Maués, estão totalmente
engajados na cultura dos “brancos” e se espalharam pelo mundo.
Quando Jesus, digo Maués, tinha oito anos de idade, conversou
com um “Papai Noel” desses de lojas e pediu-lhe uma bicicleta. Afinal, era
Natal e seu aniversário. Achava que mereceria o presente.
O pai de Maués era faxineiro de uma grande mansão. Não
ganhava o suficiente para atender aquele pedido de seu curumim, feito ao “Papai
Noel”.
O filho do patrão ganhou uma bicicleta novinha em folha.
Abandonou sua antiga “bike” na garagem. O pai de Maués achou que poderia
pegá-la e dar ao seu curumim o presente tão sonhado.
A alegria de Maués foi imensa. Mas durou pouco. No dia
seguinte, seu pai pediu de volta a bicicleta. Constrangido, foi obrigado a
devolvê-la ao mesmo lugar na garagem de onde a tinha retirado. E foi acusado de
ladrão. Pior. Foi demitido. Sem direito a seus direitos básicos de rescisão.
Escapou de ser preso por muito pouco. O patrão sentenciou:
– Perdi a confiança. Caboclo abusado e ladrão. Mas não vou
dar queixa. As cadeias estão superlotadas. Espero que se emende.
Na lógica do pai de Maués, ele não teria cometido nenhum
furto. Não se considerava ladrão. Era trabalhador. Até sua adolescência morou numa tribo. Tudo
vinha de graça da floresta. Os membros de sua aldeia tinham tudo em comum. Se
alguém não precisa mais de algo, não é errado que outro a pegue. A noção de
propriedade é diferente das dos ditos “brancos” da cidade.
Sem poder sustentar sua esposa e filho, o índio velho
adoeceu. Pegou uma gripe forte que virou pneumonia. Mas morreu mesmo de
tristeza.
Maués tem um ódio imenso de “Papai Noel”.