Água doce
Astrid
Cabral
A água do
rio é doce.
Carece de
sal, carece de onda.
A água do
rio carece
da vândala
violência do mar.
A água do
rio é mansa
sem a baba
de espumas brabas.
A água do
rio é mansa
mas também
se zanga.
Tem
banzeiro, enchente
correnteza e
repiquete.
Pressa de
corredeira
sobressalto
de cachoeira
traição de
redemoinho.
A água do
rio é mansa
corre em
leito estreito.
Mas também
transborda e inunda
também é
vasta, também é funda
também
arrasta, também mata.
Afoga quem
não sabe nadar.
Enrola quem
não sabe remar.
A água do
rio é doce
mas também
sabe lutar.
A água doce
na pororoca
enfrenta e
afronta o mar.
Filha de
olho d’água e de chuva
neta de neve
e de nuvem
a água doce
é pura
mas também
se mistura.
Tem água cor
de café
tem água cor
de cajá
tem água cor
de garapa
tem água que
nem guaraná.
A água doce
do rio
não tem
baleia nem tubarão
tem jacaré,
candiru, piranha
poraquê e
não sei mais o quê.
A água doce
não é tão doce.
Antes fosse.