Amigos do Fingidor

terça-feira, 27 de abril de 2021

Verdade histórica

 Pedro Lucas Lindoso

 

Meu amigo Tibério é supersticioso. Muito supersticioso. Carioca, veio transferido a trabalho para Manaus. A família de Tibério adaptou-se bem. Ele gosta de Manaus. Mas ao se aposentar pretende retornar ao Rio de Janeiro. Sente falta do mar. E por isso não come jaraqui. Ouviu dizer que quem come jaraqui não sai mais daqui.

Tibério conta que ficou assim por causa de Santos Dumont. Explica que o Pai da Aviação era muito supersticioso. E vira e mexe traz má-sorte. Santos Dumont abominava os números treze e oito.  Segundo Tibério, a série de máquinas voadoras projetadas por Dumont pulou do dirigível sete para o dirigível nove. O aeroporto Santos Dumont pegou fogo numa sexta-feira 13 de 1998. 

Houve um grave acidente que Santos Dumont sofreu em Paris no ano de 1898. Ora, 1898, noves fora oito.  Exatos cem anos antes do citado incêndio no aeroporto do Rio, em 1998.  Noves fora zero. O painel com seu retrato ficou intacto.

A casa de Santos Dumont em Petrópolis é a maior prova de que ele era realmente um homem supersticioso. A escada da porta de entrada foi construída de forma que no primeiro degrau só é possível pisar com o pé direito. Tibério nos relata ainda que Dumont jamais colocava chapéu em cima da cama. E proibia quem o fizesse. 

Há muitas histórias. Durante a construção do aeroporto Santos Dumont, os arquitetos do projeto nunca colocavam as iniciais SD nas plantas. Para evitar azar, usavam as AD, que não significa nada.

O pai da aviação, segundo historiadores, passava horas no terraço da casa em Petrópolis observando as estrelas com sua luneta. Apontar estrelas dá azar. Provavelmente ele nunca apontava para elas. Dizem também que apontar estrelas faz nascer verrugas no dedo.

Quando se mudou para Manaus, o corretor ofereceu a Tibério uma casa no conjunto Santos Dumont. Ele achou melhor ir para o Parque das Laranjeiras.

De tanta superstição, Santos Dumont acabou ganhando fama de azarento no mundo da aviação. Conta-se que entre os pilotos e comissários de bordo é costume bater três vezes na madeira, sempre que o nome dele é pronunciado. Tibério ia de avião com a esposa e o neto de oito anos de Manaus para o Rio. De repente o menino pergunta:

– Vovô, quem inventou o avião? Tibério respondeu.

– Foram os Wright Brothers. E advertiu a esposa:

– Não fala nada. Quando o avião descer eu vou restituir a verdade histórica.