Pedro Lucas Lindoso
Uma das
lembranças gostosas de minha infância aqui em Manaus é o gosto de nosso
guaraná, o verdadeiro guaraná, de casco escuro. Vinha envasado naquelas
garrafas de vidro que eram também utilizadas para cervejas. E os rótulos eram
de papel. As principais marcas eram Tuchaua, Baré e Magistral.
Nos
dias de festa, compravam-se dúzias de garrafas armazenadas em gradeados de
madeira. Colocavam-se as garrafas para gelar em bacias de alumínio ou tonéis. O
gelo era adquirido em barras. O gelo era partido em pedaços menores e as
garrafas de guaraná eram colocadas para gelar bem cedo. Havia poucas
geladeiras. A de nossa casa era a gás. Não existiam freezers.
No
final da festa, lembro-me que os rótulos de papel se desgrudavam das garrafas e
ficavam boiando nas bacias e tonéis. Às
vezes eu os retirava da água fria e os punha para secar.
Quando
nos mudamos para Brasília não havia do nosso guaraná por lá. Havia o tal de
guaraná “champanhe”. Esse, clarinho e sem graça, que fabricam até os dias de
hoje. Até provamos da novidade. Mas era outra bebida. Não era o nosso guaraná,
escurinho e docinho. Era preciso esperar as férias em Manaus para tomar do
nosso verdadeiro guaraná.
Há
alguns anos fiquei feliz em encontrar, nas gôndolas dos supermercados de
Brasília, o nosso guaraná escurinho. Exportamos nossos refrigerantes para
Brasília e outras lugares do Brasil.
Mas a
produção de concentrados do nosso PIM – Polo Industrial de Manaus está sob
ameaça. A produção de refrigerantes, em especial do nosso guaraná, é um dos
principais setores da Zona Franca. Querem reduzir a alíquota de isenção dos
concentrados. Vai prejudicar os produtores de cana de Presidente Figueiredo e
de guaraná de Maués. Vai gerar desemprego.
Desculpem
o baixo calão. Mas é mais uma safadeza conosco. Quando fizeram o CEP – Código
de Endereçamento Postal, criado pela Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos, em maio de 1971, nenhuma unidade da federação queria ter a dezena
69000. Diziam que o número remetia à “safadeza”. Para não dizer outra coisa. E
resolveram destinar ao Amazonas.
O
primeiro guaranazeiro nasceu dos olhos de uma jovem Maué, que se apaixonou por
um índio de uma tribo inimiga. Jurupari, o deus da escuridão, resolveu matar o
indiozinho, filho deles. As lágrimas dos pais regaram um broto do qual nasceu um
fruto vermelho. O guaraná.
Agora,
o Jurupari quer acabar com a produção dessa bebida sagrada para o povo Maué. Te
acalma Jurupari! Deixa de safadeza!