Amigos do Fingidor

terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Lenda do guaraná. Te acalma, Jurupari!

 Pedro Lucas Lindoso

 

Uma das lembranças gostosas de minha infância aqui em Manaus é o gosto de nosso guaraná, o verdadeiro guaraná, de casco escuro. Vinha envasado naquelas garrafas de vidro que eram também utilizadas para cervejas. E os rótulos eram de papel. As principais marcas eram Tuchaua, Baré e Magistral.

Nos dias de festa, compravam-se dúzias de garrafas armazenadas em gradeados de madeira. Colocavam-se as garrafas para gelar em bacias de alumínio ou tonéis. O gelo era adquirido em barras. O gelo era partido em pedaços menores e as garrafas de guaraná eram colocadas para gelar bem cedo. Havia poucas geladeiras. A de nossa casa era a gás. Não existiam freezers.

No final da festa, lembro-me que os rótulos de papel se desgrudavam das garrafas e ficavam boiando nas bacias e tonéis.  Às vezes eu os retirava da água fria e os punha para secar.

Quando nos mudamos para Brasília não havia do nosso guaraná por lá. Havia o tal de guaraná “champanhe”. Esse, clarinho e sem graça, que fabricam até os dias de hoje. Até provamos da novidade. Mas era outra bebida. Não era o nosso guaraná, escurinho e docinho. Era preciso esperar as férias em Manaus para tomar do nosso verdadeiro guaraná.

Há alguns anos fiquei feliz em encontrar, nas gôndolas dos supermercados de Brasília, o nosso guaraná escurinho. Exportamos nossos refrigerantes para Brasília e outras lugares do Brasil.

Mas a produção de concentrados do nosso PIM – Polo Industrial de Manaus está sob ameaça. A produção de refrigerantes, em especial do nosso guaraná, é um dos principais setores da Zona Franca. Querem reduzir a alíquota de isenção dos concentrados. Vai prejudicar os produtores de cana de Presidente Figueiredo e de guaraná de Maués. Vai gerar desemprego.

Desculpem o baixo calão. Mas é mais uma safadeza conosco. Quando fizeram o CEP – Código de Endereçamento Postal, criado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, em maio de 1971, nenhuma unidade da federação queria ter a dezena 69000. Diziam que o número remetia à “safadeza”. Para não dizer outra coisa. E resolveram destinar ao Amazonas.

O primeiro guaranazeiro nasceu dos olhos de uma jovem Maué, que se apaixonou por um índio de uma tribo inimiga. Jurupari, o deus da escuridão, resolveu matar o indiozinho, filho deles. As lágrimas dos pais regaram um broto do qual nasceu um fruto vermelho. O guaraná.

Agora, o Jurupari quer acabar com a produção dessa bebida sagrada para o povo Maué. Te acalma Jurupari! Deixa de safadeza!