Amigos do Fingidor

terça-feira, 25 de maio de 2010

O estranho caso da Vila da Barra – 1

Marco Adolfs


Era o dia 13 de junho do ano de 1840 quando finalmente cheguei àquela cidadezinha localizada nos confins do mundo civilizado. A manhã mostrava um radiante sol abrasador com um céu azul quase sem nuvens. Quando a embarcação aportou na pequena ribanceira em frente ao lugarejo, um certo alívio inundou-me o coração. Afinal eu havia enfrentado quase dois meses de navegação exaustiva até aquele lugar. A cidadezinha era conhecida como Vila da Barra do Rio Negro ou Lugar da Barra. Do ponto de vista geográfico estava situada na margem oriental daquele extenso rio de nome Negro, a doze ou treze milhas de sua confluência com o Amazonas. Localizada em um terreno com altitude média de quarenta pés acima do nível das águas, o lugarejo estava entranhado no meio de dois braços de rios que mais pareciam duas enseadas. Logo que deixei a barca e coloquei os pés naquela terra, fiquei sabendo que o atracadouro central, atulhado de pequenas embarcações, tinha o nome de Ribeira das Naus e respondia como o principal porto daquele vilarejo. O local exalava um estranho odor que mais parecia uma mistura de fezes com carnes apodrecidas.

Durante a longa viagem eu havia travado amizade com um comerciante de nome Salgado que trabalhava na venda de tecidos por toda aquela região. Parecia conhecer tudo e todos e, sempre que podia, me esclarecia sobre aspectos pitorescos das localidades por onde passávamos. Ao notar meu aspecto nauseabundo, esse senhor começou a explicar que aquele odor forte era proveniente da venda de comestíveis por parte de um mercado coberto que ficava localizado na rua da Matança, perto da praça. “Um local que também servia para abate de gado e exposição de peixes e tartarugas, algumas mortas e com as vísceras expostas e apodrecendo ao sol”, ressaltou. Disse ainda que parte daquele odor era “proveniente da banha e dos ovos de tartaruga colocados à venda em enormes tachos feitos de barro”. Quando cortamos por uma pequena travessa, um bando de gaivotas passou próximo de nossas cabeças. Não foi sem propósito, depois fiquei sabendo que denominavam aquele trecho de Travessa das Gaivotas...

(Continua na próxima terça)