Amigos do Fingidor

terça-feira, 3 de março de 2015

Um placebo inusitado



Pedro Lucas Lindoso


José Burana nasceu na Ilha do Gancho, Município de Manicoré, na calha do rio Madeira. Quando menino, chorava feito um bezerro, fazendo o som de bu. Foi apelidado de José Bu. Feito homem, já em Manaus, complementaram o apelido para José Burana. Sabe-se lá o porquê. O fato é que o apelido pegou.
Ao complementar quarenta anos, José Burana começou a sentir dores nas articulações. Foi ao médico de uma dessas UBS – Unidade Básica de Saúde – localizadas na Zona Leste da grande Manaus.
O médico atendeu José Burana, em consulta que durou atenciosos 12 minutos e trinta segundos. O diagnóstico foi reumatismo e a receita um conhecido antiinflamatório.
Segundo Dr. Isidio Calich, médico reumatologista, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, o reumatismo pode acometer articulações, músculos, ligamentos e tendões. Mais de 250, 300 doenças diferentes são classificadas como reumatismo. Um dos principais sintomas da doença é a dor. Todavia, dores articulares podem ocorrer por diversas razões. Há cerca de 50 anos, os antiinflamatórios foram introduzidos no tratamento do reumatismo.
Ocorre que José Burana cansou de tomar antiinflamatórios. Estava tendo desagradáveis e intercorrentes efeitos colaterais. Voltou ao médico. Por sorte foi o mesmo que o diagnosticou. As dores nas articulações continuavam. E perguntou ao doutor se havia cura para aquilo. Não aguentava mais tanto anti-inflamatório.
Dessa vez o doutor não foi muito simpático. Disse que reumatismo não tinha cura e que o Zé Burana teria que tomar remédio até a missa de sétimo dia. E que colocassem anti-inflamatório em seu caixão, porque não vendem no céu.
Zé Burana agradeceu ao médico e saiu da UBS determinado a procurar algum tratamento alternativo para seu reumatismo crônico.
Um sábio ribeirinho curandeiro, cheio de saberes tradicionais, advindos de anos de experiências na floresta amazônica, receitou ao Zé Burana banha de cobra. Não tinha nenhuma naquele momento para lhe dar. Era um pouco difícil de achar, mas José Burana deveria tomar. Era tiro e queda.
Em viagem ao vizinho município de Manacapuru, José Burana encontrou uma banca de produtos amazônicos. Por fim, o dono da banca lhe vendeu a tal banha de cobra.
Como o gosto era muito ruim, José Burana aproveitou cápsulas de tetrex, esvaziando-as e colocando a tal banha dentro. A cápsula explodiria no estômago e ele não sentiria o gosto intragável da banha.
E não é que o José Burana melhorou. Quase ficou bom. Foi lá em Manacapuru só para comprar mais banha de cobra.
Foi então que o vendedor confessou:
– José, como eu não tinha banha de cobra, eu te vendi banha de jacaré. Mas não tem problema não, porque o jacaré é mais esperto que a cobra, mais evoluído.
Quando ele me contou a história eu lhe disse que tinha servido como placebo.
E ele me perguntou:
         – Placebo é sebo de que? Sucuri, jacaretinga ou tartaruga?