Amigos do Fingidor

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Maçãs podres



Inácio Oliveira


Quando meu avô estava para morrer ele desejou comer uma maçã. Era difícil encontrar maçãs na nossa cidade; meu pai percorreu todas as feiras naquele domingo sem encontrar nenhum lugar que vendesse maçãs. As maçãs levavam meses para chegar, vinham do sul em caminhões cobertos com lona, quando chegavam já estavam quase estragadas. Nunca vi meu avô comer uma maçã. Quando ele ficou doente era difícil comer qualquer coisa, tomava quase só líquidos, mas assim que soube que ia morrer pediu que meu pai lhe trouxesse uma maçã. Meu avô morreu sem realizar seu último desejo. Ele podia ter desejado comer uma banana, mas queria comer uma maçã. Agora, quando meu pai encontra maçãs na feira ele compra e traz para casa, coloca na fruteira sobre a mesa e não come nenhuma, deixa que elas apodreçam no calor da tarde. Depois de alguns dias as maçãs podres sobre a mesa me parecem uma coisa bela e comovente, um desejo não saciado.