Amigos do Fingidor

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Influência da astrologia na medicina



João Bosco Botelho

Na Mesopotâmia dos anos 1700 a.C., existiu forte presença de práticas de adivinhação, descritas nas tábuas de argila, com escrita cuneiforme, o que acontece em várias passagens do Antigo Testamento. De modo geral, os adivinhos atuavam em duas vertentes: a astrologia e a hepatoscopia (aspecto do fígado) dos carneiros sacrificados.
A astrologia mesopotâmica pretendeu estabelecer a relação entre os movimentos dos astros e as doenças. A aceitação coletiva gerou formidável exército de especialistas, capazes de interpretar os movimentos dos astros como sinais de diagnóstico e prognóstico.          
É possível que a hepatoscopia estivesse atada às primitivas relações pré-históricas com o sangue. O fígado, como o mais sanguíneo dos órgãos, era identificado como o centro da vida. Assim, quem pudesse interpretar as mensagens contidas no fígado dos animais sacrificados, estaria mais próximo de saber onde, quando e como as doenças acometeriam as pessoas.
Parece que o mais antigo deus protetor da Medicina, na Mesopotâmia, foi representado pela Lua, com o nome de Sin. Essa divindade noturna governava o crescimento das ervas medicinais, por esse motivo, não poderiam ser expostas aos raios do sol.
Entre os mais poderosos deuses do panteão mesopotâmico, protetores dos adivinhos e dos médicos, capazes de provocar doença e garantir a saúde se destacam: Marduk, o grande deus curador; Ninib, filho de Enlil, deus protetor; Nabu, deus das ciências e da arte de curar; Ninchursag, deus ligado a oito divindades, cada uma com poder de curar uma doença específica; Ninurta, deus dos médicos; Gula, mulher de Ninurta; Ningischzida, filho de Ninurta, representado pelas duas serpentes enroladas no bastão; Sachan, a deusa-serpente; Ishtar, a deusa da graça, da fecundação e criadora da libido no homem e na mulher.
Além desses deuses e deusas, os demônios responsáveis pela dor e doenças: Nergal, da febre; Ashakku, do pulmão; Tiu, dor de cabeça; Namtaru, da boca, do nariz e das orelhas.
Os adivinhos, valorizados e bem pagos, se construíram junto ao convencimento coletivo da capacidade de empurrarem os limites da morte. Por outro lado, a medicina mesopotâmia se aderia à astrologia, onde a presença de deuses e demônios era entendida como fator importante à obtenção da cura.
Alguns deuses, influenciados pelo movimento dos astros, poderiam se postar a favor ou contra certa doença, dependendo do ato cometido pelo doente: Marduk e Gula são os principais exemplos.
A relação da medicina mesopotâmica com a adivinhação, tanto por meio da astrologia quanto pela hepatoscopia, está descrita nas tábuas de argila onde é possível identificar dois tipos de médicos: Ashipu, do diagnóstico quase sempre obtido com a ajuda dos deuses, e Asu, do tratamento com plantas medicinais usadas em determinadas confluências dos astros.
Mantendo-se as obrigatórias margens históricas, sem pretender comparar, professores e alunos da Universidade Federal do Amazonas, entre 1982 e 1984, no trabalho de extensão, que eu tive a honra de coordenar, no município do Coari, nas comunidades ao longo do rio Copeá, comprovou o quanto é forte a relação das pessoas com os astros e a crença coletiva de terem poder de causar doenças mortais. 
Em uma dessas pequenas comunidades, no alto Copeá, vimos os hansenianos com as imagens de São Lázaro atadas no pescoço e ouvimos a benzedeira explicar porque algumas plantas medicinais não curam: colhidas na má influência da lua ou do sol. E repetiu enfática: só cura quem conhece o céu!