João Bosco Botelho
Com a consolidação do sedentarismo no
Neolítico, importantes modificações foram se processando nos grupos sociais que
habitavam a Mesopotâmia, a Índia e o Egito. Nessa fase, se iniciou a modificação
da economia produtora de subsistência coletiva para a divisão de trabalho, o aparecimento
do excedente de produção e as trocas comerciais.
Na urbanização, nas margens dos grandes rios,
Indo, Nilo e Mesopotâmia, as sociedades mostravam-se francamente hierarquizadas.
A propriedade privada se fortaleceu também, possibilitando o processo de
assentamento duradouro dos grupos humanos, que evoluiriam para a organização
das primeiras aldeias. Esse aldeamento estratificado é encontrado em torno de 5.000
anos.
Os aldeamentos deram lugar às cidades, cujas
edificações foram sendo construídas com material permanente, argamassa, madeira
e pedra tratada, como produto da transformação e fortalecimento dos grupos
humanos sedentários. Essa fantástica e rápida mudança gerou as civilizações com
culturas-linguagens regionais. Entre elas, destacaram-se pela organização
social em torno da posse territorial: a babilônica, a egípcia e a indiana.
Nesses grupos, floresceram práticas médicas que
influenciaram, direta ou indiretamente, o pensamento ocidental em torno da vida
e da morte, da saúde e da doença.
Essas
civilizações regionais assimilaram formas de governos, predominando o
teocrático de regadio e o mercantil-escravista. As guerras fratricidas frequentes
e contínuas ofereciam os saques como produto final, novos escravos e
territórios, fortalecendo a propriedade privada e a escravidão. Durante as
guerras, deve ter ocorrido participação ativa dos médicos, principalmente, no
manuseio das grandes feridas traumáticas e amputações dos membros dilacerados.
Significativas mudanças sociais acompanharam o sedentarismo.
Entre algumas mais significativas que contribuíram para aumentar as trocas do
excedente da produção e fortalecer a maior especialização, destacaram-se: os
metais fundidos, o cobre, a mecanização da agricultura (com os arados primitivos)
e o barco a vela.
Incorporadas nesse contexto de mudanças
rápidas, surgiram novas relações com o corpo humano, notadamente, certo
desvendar do escondido atrás da pele patrocinado pelo manuseio, nos rituais de
sacrifício religioso e nas condutas para evitar a putrefação depois da morte.
De
certa forma interferindo no complexo conjunto gerador do sedentarismo, as
mudanças climáticas ocorridas, por volta de 10.000 anos, na Europa, também
proporcionaram incríveis transformações nas relações sociais dos
caçadores-coletores. O recuo das geleiras provocou a migração da fauna em
direção às regiões setentrionais, com a consequente substituição das estepes
pela floresta, obrigando a outras adaptações.
Essa
última grande modificação climática do planeta, resultante do deslocamento das
geleiras, interferiu na passagem do antepassado caçador‑coletor para caçador‑plantador.
O fato representou tamanha importância que pode ser compreendido como fase
intermediária para a concretizar a cultura sedentária. Foi quando as
comunidades neolíticas optaram pela vida ligada à posse do território, ao
contrário das anteriores que eram nômades.
Essa
transformação social, também chamada de revolução agropastoril do Neolítico, se
processou como o produto final de combinações de circunstâncias que levaram o
homem a tirar da terra parte do sustento, impondo profundas reconstruções no
entendimento das doenças e da saúde.