Amigos do Fingidor

terça-feira, 1 de maio de 2018

Cadeira de balanço




Pedro Lucas Lindoso

Eu, Cadeira de Balanço,
movediço trono e plataforma alada,
pra sempre antiga mesmo quando nova.
                                   (Max Carphentier)

As cadeiras de balanço em vime estão na memória afetiva da maioria dos amazonenses. Possivelmente, de muitos brasileiros também. Praticamente, em todas as casas da Manaus de antigamente havia cadeiras de balanço. Feitas de vime.
Só mesmo o grande bardo Marx Carphentier descreveria uma cadeira de balanço como “movediço trono e plataforma alada”. Ao ler o poema, exclamei: Meu Deus, a cadeira falante ressuscitou! É a cadeira de minha avó.  Uma das cadeiras de balanço da chácara da Vila Municipal. A cadeira em que minha avó sentava. Um trono! Decerto um verdadeiro trono! De uma carinhosa rainha drusa. Que acalentava netos em seus braços de generosos afagos.
Não tive dúvidas. A cadeira de minha avó ressurgia no poema de Max. “Uma plataforma alada”. Claro, a cadeira que na minha imaginação metamorfoseava-se num simpático Pégaso. Aquele cavalo alado da mitologia, símbolo da imortalidade. Seres mágicos capazes de alimentar-se de nuvens do entardecer e raios de sol. Justamente no entardecer de tardes úmidas e mornas. Pégasos imaginários que traziam do firmamento uma aragem benfazeja para presentear as pessoas. Aragem recolhida nos rios e igarapés que alagam a floresta. Era esse presente que minha avó desfrutava quase todas as tardes, em sua cadeira de balanço. Cuidadosamente posta na calçada, em frente ao grande portão, para o lado da pracinha.
Minha avó fazia várias atividades sentada em sua cadeira de balanço. Sempre gostou de ler enquanto se embalava. Ver televisão. Acarinhar os netos. Conversar com os vizinhos e principalmente desfrutar do suave frescor do lusco-fusco manauara.
As cadeiras de balanço atuais são diferentes daquelas da Manaus dos anos sessenta. Há muitas fabricadas em modelos tradicionais com fios de plástico. Outras são feitas de “junco”, uma fibra sintética.
Meu irmão mais velho, que mora em São Paulo, num rasgo de saudosismo, manifestou a vontade de ter uma cadeira de balanço em vime. Como as de antigamente. Encomendei a cadeira ao seu Ernandes. Um valoroso marceneiro com estabelecimento na esquina da Joaquim Nabuco com a Avenida Getúlio Vargas. Levei a cadeira embalada, normalmente despachada, em voo para São Paulo.  Não preciso dizer que o paulista baré encantou-se com o presente. Mais uma vez, o poeta estava certíssimo. As cadeiras de balanço são sempre antigas, mesmo quando novas.
E eu agradeço ao poeta por ter ressuscitado a cadeira de minha infância. Volto ao presente. Fico na certeza que as cadeiras de balanço já não são mais coisas somente das avós. A cadeira de balanço é um convite para ler, fazer poesia e principalmente relaxar.
Num país tropical como o nosso, a cadeira de balanço, ainda parafraseando Carphentier, é a “torre de vigia das varandas”. “Sempre velhos e jovens contemplam nos meus braços a próxima paisagem e a invisível”.
E eu convoco novamente o Pégaso de minha infância. O eterno comedor de nuvens e raios de sol. Sento-me na cadeira de balanço. Só me resta meditar e relaxar. No balanço das recordações.
PS: O poema “No balanço das recordações”, de Max Carphentier, encontra-se na página 79 do recém lançado livro A palavra de tudo, pela Editora Sejamos Luz.