Amigos do Fingidor

sexta-feira, 1 de abril de 2011

O teatro mítico de Márcio Souza – 5/5

Zemaria Pinto


O teatro mítico de Márcio Souza é uma amostra da riqueza e diversidade dos mitos amazônicos. Uma das finalidades deste trabalho era mostrar as relações interculturais entre os mitos nativos e os mitos universais – não apenas gregos e latinos, mas também judaico-cristãos. Onde termina a originalidade e começa a contaminatio, não cabe aos Estudos Literários identificar – talvez à Antropologia. Importante também era demonstrar que os textos servem de veículo para a “representação espetacular” de rituais, costumes, origens do artesanato, da música, do patriarcado e até de técnicas agrícolas – como preconizado pela Etnocenologia, uma disciplina bem posterior à elaboração dos textos (GREINER; BIÃO, 1999).

Márcio Souza inscreve-se, hoje, entre os grandes dramaturgos deste país, ainda que sob o risco de ser tachado de “regionalista” por uma crítica cosmopolitamente provinciana. Sem entrar nos meandros teóricos, posso garantir que o regionalismo é uma questão de perspectiva: como diz Aldisio Filgueiras, parceiro constante de Márcio Souza, Manaus não é longe; longe é o Rio de Janeiro, São Paulo, Tóquio, Paris... O dramaturgo Márcio Souza é universal na medida em que suas peças refletem a intricada relação entre o homem contemporâneo, com suas práticas e hábitos sociais e mentais, e as perspectivas históricas mais diversificadas – do tempo mítico à temporalidade mais banal; da leitura dos jornais de hoje, por exemplo. A floresta amazônica de Márcio Souza é tão universal quanto as províncias de Balzac e de Gogol e os sertões de Graciliano Ramos e de Guimarães Rosa, no que esses autores transcendem a mera geografia para se inserir como repositórios das mais recônditas experiências humanas.


REFERÊNCIAS


ARISTÓTELES. Poética. In: A poética clássica. Tradução: Jaime Bruna, 2. ed. São Paulo: Cultrix, 1988.

BACHELARD, Gaston. Fragmentos de uma poética do fogo. Trad. Norma Telles, São Paulo: Brasiliense, 1990.

CASCUDO, Luis da Camara. Dicionário do folclore brasileiro. 6. ed. Belo Horizonte: Itatiaia, São Paulo: EDUSP, 1988.

_____________. Geografia dos mitos brasileiros. 3. ed. Belo Horizonte: Itatiaia, São Paulo: EDUSP, 1983.

_____________. Em memória de Stradelli. 2. ed. Manaus: Governo do Estado do Amazonas, 1967.

CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de símbolos. Tradução: Vera da Costa e Silva et al. 2. Ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1990.

ELIADE, Mircea. Aspectos do mito. Tradução: Manuela Torres, Lisboa: Edições 70, 1986.

GREINER, Christine; BIÃO, Armindo (Org). Etnocenologia: textos selecionados. São Paulo: Annablume, 1999.

KRÜGER, Marcos Frederico. Amazônia: mito e literatura. Manaus: Valer / Governo do Estado do Amazonas, 2003.

KUMU, Umúsin Panlõn; KENHÍRI, Tolamã. Antes o mundo não existia. Introdução e texto final: Berta Ribeiro. São Paulo: Cultura, 1980.

GRIMAL, Pierre. Dicionário da mitologia grega e romana. Trad. Victor Jabouille, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1992.

SOUZA, Márcio. O palco verde. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1984.

_____________. Teatro I. São Paulo: Marco Zero, 1997.