Jorge Tufic
O quanto dissemos, no entanto, ao
desembocar nas teorias extremamente provocadoras do século XX, com seus mitos
tecnológicos e o pretendido “discurso de ninguém”, amplia-se numa sequência de fatos
ligados à conquista da fotografia, do cinema, das artes plásticas, e conduzem à
nova ciência de ler o mundo, que tem na Semiologia o seu ponto de apoio. Assim,
o campo ainda mal definido do poético excita os pesquisadores a testarem a
saturação verbal do Ocidente, opondo-lhe ou impondo-lhe o ícone utilizado no
Oriente. A ocorrência de uma ruptura com a tradição ocidental torna-se, deste
modo, inevitável com os trabalhos de Fenollosa, cuja influência sobre Ezra
Pound resulta numa poética de estrutura gráfica, como a de Mallarmé. Umberto
Eco: “A Poética, no sentido mais lato da palavra, se ocupa da função poética
não apenas da poesia, onde tal função se sobrepõe a outras funções da
linguagem, mas também fora da poesia, quando alguma outra função se sobreponha
à função poética.”
A
liberdade criadora atinge o seu clímax. Renova-se o vocabulário com o
dia-a-dia, as gírias vão sendo aproveitadas, os padrões castiços cedem ao
incremento de novas experimentações no domínio da sintaxe, com o pronome
oblíquo iniciando períodos, entre muitas outras, inclusive a busca de recursos
poéticos nos falares indígenas. Acirram-se as polêmicas entre os epígonos do
concretismo, do neoconcretismo e os defensores do verso, os sinólogos, como eram considerados por
Fenollosa. É nesse estágio, precisamente, que uns e outros se aprofundam em sua
teoria a respeito do objeto poético ou objeto da poesia, estes procurando
estabelecer uma forma que pudesse distinguir a prosa da poesia, revalorizando a
função da metáfora, e aqueles colocando a poesia como “antiliteratura”, estando
mais relacionada com as artes (pintura, música etc.), do que com a sintaxe
lógico-discursiva da prosa. Entre os defensores do verso estão, naturalmente,
os poetas da geração de 45. Alguns poemas concretos, explorando ainda o valor
da palavra em seus diversos níveis (prosódico, sintático, semântico), os
poemas-objetos e a poesia/processo, afirmam em definitivo a posição de uma
vanguarda atuante, já repercutindo em outros países da América e da Europa.
OLHO POR OLHO, de Augusto de Campos, é um exemplo de clareza e eficácia. O
próprio autor explica que o mesmo “não necessita de ‘chave léxica’ explícita
porque se compõe de signos extraídos da realidade cotidiana: uma esteira de
olhos arrancados a personagens conhecidos conduz a um triângulo formado por
sinais de trânsito, de significação universal (...). Esse poema
'inqualificável' tem, pois, uma semântica visível a olho nu.”