Amigos do Fingidor

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Curso de Arte Poética

Jorge Tufic


                     Quanto aos defensores do verso, da metáfora, a estes caberia também um avanço mais arrojado em suas pesquisas. Os estudos dedicados ao assunto muito contribuíram para isso. A análise estrutural “descobriu” um outro Rimbaud por trás da aparente obscuridade de seus quartetos (“A estrela chorou rosa no coração de tuas orelhas, /O infinito rolou branco de tua nuca a teus rins, /O mar perolou ruivo em suas mamas vermelhas, /E o homem sangrou negro em teu flanco soberano”). Eros e Tânatos se irmanam, então, para uma análise permanente do texto aberto, atribuindo mais importância aos símbolos que engendram o conteúdo da mensagem poética, do que propriamente aos valores relativos da forma em que foram vazados. Abre-se, pois, o leque das confluências e as divergências parecem reduzir-se, na medida em que umas e outras correntes de ideias terminam por encontrar-se no mesmo sistema de fragmentação (ou destruição, como preferem os semiólogos) do discurso ou da estrutura, verbal ou não-verbal, do objeto “poético”, sem que, tampouco, se tenha chegado à conclusão do que seja este objeto ou do que seja este poético. Em “Sísifo”, livro de poemas de Marcus Accioly, há uma sequência de fundo “didático” que começa por estabelecer a diferença entre prosa e poesia, entre o lírico e o épico, entre o antigo e o moderno; a sequência prossegue com animais & pássaros, com a natureza, e termina com a “linguagem” das estrelas, um desfecho no qual as palavras se desarticulam, os fonemas invadem o espaço do objeto que tentam “segurar”, e, de tudo, restará ao final a “linguagem da água / no silêncio”, onde a palavra silêncio, escrita e repetida quarenta e quatro vezes, com todas as suas letras entre parêntesis, resulta numa superfície compacta, num daqueles signos polivalentes que chegam a demonstrar as funções referidas: água, vento, moléculas, átomos, silêncio.

                   Assim posto, tanto faz o poeta saturado de tradicionalismo abandonar o verso, como o poeta do verso persistir em sua necessidade, desde que ambos estejam empenhados na “localização” da poesia (e note-se que Rimbaud, autor do quarteto citado, é um poeta do século XIX), os efeitos reais não levam a outra coisa, a menos que o agente, embora limitado por sua época, consiga reafirmar o ethos da liberdade criadora através de arrojadas metáforas, a exemplo de Sousândrade. As palavras de ordem são de Pierre Albert-Birot: “A arte começa onde a imitação acaba”. Ou: “Procurai outra coisa, sempre outra coisa; porque procurar é viver e encontrar é morrer”. A poesia está em tudo, desde que o viver a reconheça. Nós estamos na Era da Máquina, mas raros se apercebem disso. A nostalgia bucólica, o cravo na lapela, já não comovem o Ral do progresso científico. O homem semiótico está aí mesmo: “...pensar profundamente é pensar o mais longe possível do automatismo verbal” (Paul Valery).