Jorge Tufic
Quanto aos defensores do verso, da
metáfora, a estes caberia também um avanço mais arrojado em suas pesquisas. Os
estudos dedicados ao assunto muito contribuíram para isso. A análise estrutural
“descobriu” um outro Rimbaud por trás da aparente obscuridade de seus quartetos
(“A estrela chorou rosa no coração de tuas orelhas, /O infinito rolou branco de
tua nuca a teus rins, /O mar perolou ruivo em suas mamas vermelhas, /E o homem
sangrou negro em teu flanco soberano”). Eros e Tânatos se irmanam, então, para
uma análise permanente do texto aberto, atribuindo mais importância aos
símbolos que engendram o conteúdo da mensagem poética, do que propriamente aos
valores relativos da forma em que foram vazados. Abre-se, pois, o leque das
confluências e as divergências parecem reduzir-se, na medida em que umas e
outras correntes de ideias terminam por encontrar-se no mesmo sistema de
fragmentação (ou destruição, como preferem os semiólogos) do discurso ou da
estrutura, verbal ou não-verbal, do objeto “poético”, sem que, tampouco, se
tenha chegado à conclusão do que seja este objeto ou do que seja este poético.
Em “Sísifo”, livro de poemas de Marcus Accioly, há uma sequência de fundo
“didático” que começa por estabelecer a diferença entre prosa e poesia, entre o
lírico e o épico, entre o antigo e o moderno; a sequência prossegue com animais
& pássaros, com a natureza, e termina com a “linguagem” das estrelas, um
desfecho no qual as palavras se desarticulam, os fonemas invadem o espaço do
objeto que tentam “segurar”, e, de tudo, restará ao final a “linguagem da água /
no silêncio”, onde a palavra silêncio, escrita e repetida quarenta e quatro
vezes, com todas as suas letras entre parêntesis, resulta numa superfície
compacta, num daqueles signos polivalentes que chegam a demonstrar as funções
referidas: água, vento, moléculas, átomos, silêncio.
Assim
posto, tanto faz o poeta saturado de tradicionalismo abandonar o verso, como o
poeta do verso persistir em sua necessidade, desde que ambos estejam empenhados
na “localização” da poesia (e note-se que Rimbaud, autor do quarteto citado, é
um poeta do século XIX), os efeitos reais não levam a outra coisa, a menos que
o agente, embora limitado por sua época, consiga reafirmar o ethos da liberdade criadora através de
arrojadas metáforas, a exemplo de Sousândrade. As palavras de ordem são de
Pierre Albert-Birot: “A arte começa onde a imitação acaba”. Ou: “Procurai outra
coisa, sempre outra coisa; porque procurar é viver e encontrar é morrer”. A
poesia está em tudo, desde que o viver a reconheça. Nós estamos na Era da
Máquina, mas raros se apercebem disso. A nostalgia bucólica, o cravo na lapela,
já não comovem o Ral do progresso científico. O homem semiótico está aí mesmo:
“...pensar profundamente é pensar o mais longe possível do automatismo verbal”
(Paul Valery).