Marco
Adolfs
Nas
minhas andanças pela Amazônia, realizando alguns documentários, sempre me
deparei com o inusitado e o estranho em cada esquina da “mata”. Lembro de estar
em um flutuante-alojamento de pesquisadores da Reserva de Mamirauá, localizado
no município de Tefé, a 575 quilômetros de Manaus, onde os pesquisadores assoviavam
para que o “cachorrinho” Fred se apresentasse na hora da comida (almoço). Só
que o cachorrinho em questão era um enorme jacaré de três metros de comprimento.
Verdade! O bicho atendia pelo nome de Fred, e vivia no lago que circundava o
nosso flutuante-alojamento. Esperando a hora do lanche para “abanar” o rabinho...
e comer. Nesse mesmo lugar, eu e o cinegrafista Bosco (Índio), resolvemos então
que no dia seguinte, ainda no escuro da madrugada, sairíamos para fazer algumas
tomadas do amanhecer no lago do Mamirauá. Nem dormimos direito e logo estávamos
entrando em uma “voadeira” (pequeno barco de alumínio movido a motor) para
pegarmos algumas cenas do nascer do Sol em meio a nuvens de um vermelho
tinto-sangue. Mas, mal andamos alguns metros e o pequeno barco começou a ser
sacudido pelo que parecia ser um improvável terremoto (Mas como? Na água?).
Para nossa surpresa estávamos passando bem no meio de um enorme cardume de
peixes que, de tão acelerados e afoitos, começaram também a voar, saindo da
água em pulos aloucados, diretamente para dentro do nosso barco, atingindo a
mim e ao cinegrafista. Posso dizer que naquela manhã não só fizemos belas
tomadas da região, rica em uma fauna exuberante, mas também voltamos para o alojamento
com alguns peixes de 30 cm para o almoço daquele dia. Nosso almoço e do Fred.
Outro
fato interessante aconteceu quando eu estava, sozinho e com uma câmera na mão, seguindo
um bando de índios da etnia Miranha, indo para aldeia do Miratu, enquanto
filmava um documentário sobre a farinha
do Uarini, no distante município do mesmo nome. Para quem não sabe, o povo Miranha foi
considerado, na história indígena, como uma espécie de “bárbaros” e “antropófagos”.
Seus chefes ficaram conhecidos por vender aos brancos prisioneiros inimigos,
membros de hordas rivais, ou mesmo seus próprios filhos. Esse termo “Miranha”
foi empregado na sociedade colonial como um classificador genérico, que
englobaria tribos inimigas. O fato é que lá estava eu, no meio de uma fila de
índios Miranha, caminhando com a minha câmera, pelo leito do seco de um rio.
Uma caminhada que duraria horas. Eu fora atraído pela história de uma índia,
que me dissera que, lá, na aldeia do Miratu, estavam aparecendo, nos quintais
de suas casas, peças arqueológicas estranhíssimas. Deixei o documentário sobre
a farinha do Uarini de lado e fui atrás de tal achado.
Lá
pelas tantas, depois de muito caminhar, apareceu um índio vindo no sentido
contrário ao nosso. Vinha correndo e com um enorme facão luzidio, de tão afiado
e brilhando ao sol. Se aproximou do branco da história (eu!) e começou a
esfregar o facão pelo meu pescoço, enquanto falava alguma coisa em seu dialeto.
Fazia cara de brabo e parecia prestes a me degolar ali mesmo. Mas não demorou
muito a seriedade geral, e os outros não contiveram o riso e caíram na
gargalhada generalizada. Riam aos borbotões; de caírem ao chão. Foi quando o
índio antropófago também riu e se apresentou.
–
Prazer, meu nome é Jozildo e sou professor de História em uma escola em
Uarini...Também sou o tuchaua (cacique ou chefe) da tribo...Seja bem-vindo.
Dali
para frente a gaiatice era geral entre todos. Mas, naquela caminhada, além de
afundar, com câmera e tudo, em uma areia movediça que existia no caminho, tive ainda
que beber uma bebida vermelha, fermentada, que eles haviam preparado para uma
festa improvisada. Preciso dizer que tive alucinações?...