Amigos do Fingidor

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Mãe-Terra: pressuposto da fome saciada 1


João Bosco Botelho

 

De caçador-coletor à vida sedentária
 

As mudanças climáticas ocorridas, em torno de 12000 anos AP (Antes do Presente), na Europa, proporcionaram incríveis transformações nas relações sociais dos caçadores‑coletores. O recuo das geleiras provocou a migração da fauna em direção às regiões setentrionais, com substituição das estepes pela floresta, obrigando os nossos ancestrais distantes à se adaptarem à nova fase.  

Os elementos sagrados continuaram acompanhando os caçadores-coletores na nova trajetória de conquistas. O espaço que garantia a sobrevivência havia se deslocado, efetivamen­te, em direção das terras férteis próximas aos rios e lagos.  

O lago de Stellmoor, perto de Hamburgo, na Alemanha Ocidental, constitui marco desse período. Muitos objetos com forte aparência de sacralidade, encontrados nesse sítio arqueológico, datam de 8.000 anos. Um deles chamou particularmente a atenção: a estaca de pinho com um crânio de rena na sua porção mais alta. Os posteriores estudos do solo comprovaram incontáveis resíduos ósseos desse animal, com claras marcas de a carne ter sido retirada com a ajuda de artefatos de pedra. Esse fato sugere que a rena representou uma das mais importantes fontes da sobrevivência daquelas pessoas que lutavam diuturnamente contra o congelamento dos próprios corpos.

Em outra área de pesquisa arqueológica neolítica, não muito distante da anterior, foi resgatado um tronco de salgueiro com mais de três metros de comprimento, grosseiramente esculpido, se percebendo a cabeça e o pescoço de uma figura humana.  O simbolismo expressado nos totens parece configurar a convivência de dois momentos distintos do universo mítico: a divinização do bicho e a do próprio homem. Dessa forma, parece lógico pressupor não ser difícil, para quem já tornou sagrado o circundante, tomar para si a sagração. 

A última grande modificação climática do planeta, resultante do deslocamento das geleiras, interferiu na passagem do antepassado caçador‑coletor à vida sedentária, quando as comunidades neolíticas optaram pela vida mais sedentária, ao contrário das anteriores, nômades. 

A mudança também reconhecida como Revolução Agro‑Pastoril do Neolítico se processou como o produto final de combinações circunstanciais, culminando com as práticas agrícolas.

É certo que não podemos estabelecer limites rígidos no tempo para situar esse aspecto civilizatório para as diferentes culturas. Contudo, é possível assimilar que os povos situados em diferentes continentes viveram situações semelhantes em fases diversas, variando de 10.000, na Mesopotâmia, a 7.000 anos, no planalto mexicano.