Amigos do Fingidor

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Medicina na Índia antiga


 

João Bosco Botelho

 

É provável que a Medicina na Índia antiga já estivesse sistematizada séculos antes da invasão pelos arianos vedas, em torno do ano 2000 a.C. A suposição é baseada nos estudo arqueológicos feitos na cidade Mohenjo-Daro, no noroeste da Índia, nas margens do rio Indo. Nessa cidade foram encontradas ruas bem traçadas, com rede de esgotos, canalização para água e banhos públicos. Os achados colaboram na confirmação de que essa civilização tinha ideia bem precisa da importância dos cuidados de saúde pública na profilaxia da doenças.

A primeira sistematização da Medicina na Índia antiga está contida no Ayurveda, escritos originalmente em sânscrito e plenos de religiosidade. O Ayurveda significa o Veda da Longevidade e constitui a base teórica da Medicina tradicional da Índia. O texto original tem no seu conjunto mil capítulos divididos em cem mil versículos ou Shlokas, divididos em Ashtânga, palavra que até hoje é utilizada na Índia como sinônimo de Medicina.

O Ayurveda tem oito capítulos bem definidos, e que tratam de diferentes assuntos médicos:

1-      Shalya – cirurgia para retirada de corpo estranho, feto morto retido intrauterino, drenagem de ferida com pus e a utilização de instrumental cirúrgico para efetuar estes e outros procedimentos.

2-      Shalakya – cirurgia dos olhos, nariz, orelhas e garganta, considerada nos tempos atuais como verdadeiro tratado de oftalmologia e otorrinolaringologia.

3-      Kayacikitsã  trata da terapêutica em geral com mais de oitocentos diferentes tipos de plantas com propriedades medicinais.

4-      Bhutavidya – ensinamentos que permitem tratar com os espíritos dos mortos, com os demônios e com os doentes que foram possuídos pelos deuses que causam as doenças.

5-      Kaumarabhritya – cuidados dos recém-nascidos e das mulheres grávidas.

6-      Agadatantra – toxicologia, aos venenos e antídotos.

7-      Rasayana ou Jarâ  – ervas do rejuvenescimento e os afrodisíacos que contribuem para a manutenção da saúde.

8-      Vajikarana ou Vrisha – descreve as propriedades dos afrodisíacos.

 

Os tratamentos encontrados no Ayurveda distinguem os remédios que fortaleciam o organismo e os que curavam. Os primeiros eram os afrodisíacos e os segundos eram os vegetais com propriedades terapêuticas que deveriam ser tomados segundo as normas rituais contidas nos Vedas. Neste tratado de terapêutica estão descritas mais de setentas diferentes espécies de vegetais que foram usadas na Índia durante mais de três mil anos.

Ainda segundo os ensinamentos contidos no Ayurveda, as doenças se dividem em três tipos: as curáveis ou Sadhya, as que podem melhorar ou Yapya e as incuráveis ou Pratyakhyeya. Admite claramente que as doenças são consequentes de culpas das vidas anteriores ou Karmaja e que para curá-las totalmente é indispensável a penitência ou Prayashcitta.

Os deuses e os demônios védidos representam um parte importante do conjunto médico contidos nos textos védicos. Os deuses curadores mais importantes são os gêmeos Ashvin, que no Rigveda (X, 39, 3b) aparecem como médicos dos cegos, dos desnutridos e dos que sofreram fraturas. Outro deus curador veda é Rudra, de duplo caráter, maléfico e caridoso, e que se transformou em Shiva, o grande deus moderno do hinduismo. O Shiva moderno mantém a duplicidade do primitivo Rudra, sendo o deus caridoso e colérico. O deus Rudra é adorado como o primeiro médico divino nos versos do Yajurveda.

Varuna é o terceiro mais importante deus médico da mitologia indiana. Ele é considerado o ordenador da ordem cósmica. A doença também é entendida como o castigo pelo pecado cometido contra a ordem estabelecida por Varuna.

Ainda nos Veda, os demônios como Nirrit, que encarna a perdição, Grahi o endemoninhado e os Rakshas especializados nos abortos são os principais causadores das doenças incuráveis.

A relação entre a doença e o castigo divino é constante. Todas as causas das doenças físicas pertencem ao domínio das transgressões das normas de conduta social. Alguns desses conceitos sobreviveram no tempo e continuam vivos na atualidade.