Amigos do Fingidor

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Curadores e adivinhos como agentes políticos



João Bosco Botelho

    As forças das resistências ao cristianismo, no Brasil, em especial, ligadas aos curadores e adivinhos, ocorreram em três vertentes:
    Duas oriundas do período colonial:
              - Indígena: em torno dos pajés;
              - Africana: próxima aos pais e mães de santo.
    Outra, muito mais recente, a partir dos anos 1960, possivelmente ligada à estratégia política para enfraquecer a Teologia da Libertação, associada às ideias marxistas, em claro conflito com a política norte-americana para a América Latina:
              - Brasileira: atada aos pastores neopentecostais.
    Quanto à indígena, o padre salesiano Alcionílio Bruzzi, depois de conviver du­rante mais de duas décadas com grupos indígenas de diferentes etnias, no Alto Rio Negro, é testemunha dessa resistência, como história de longa duração: "É talvez o maior sacrifício que a catequese católica impõe aos indígenas cristãos, a renúncia à crença no poder do pajé. Em alguns casos só o consegue parcialmente".
    Nos quase quinhentos anos, no Brasil, nos quais a Igreja combate sistematicamente os curadores e adivinhos sem compreendê‑los como agentes de coesão social, não está conseguindo processar a linguagem sedutora capaz de satisfazer os atuais desejos nascidos nas contradições político-econômicas mais atuais.
    Essa dissociação entre a hierarquia eclesiástica e a concepção do sagrado das massas populares, em parte responsável pelo esvaziamento das paróquias e a diminuição gradativa da confissão da fé católica está clara no discurso disciplinador do Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Eugênio de Araújo Sales, nos anos 1990, um dos mais ilustres representantes do clero: "...os assuntos abordados foram os desvios graves da piedade popular, desde as práticas da macumba, candomblé, umbanda, até o espiritismo e outros do tipo pentecostal. Está incluído também o recurso à superstição e à exposição incompleta da Doutrina genuína."
    Do outro lado, as igrejas neopentecostais divulgam mensagens mais sedutoras promovendo as sessões de curas e catarses ao som dos cânticos de louvor entoados por milhares de fiéis. Com essa estratégia, penetram com maior facilidade na vontade popular e ocupam os espaços sociopolíticos nascidos do desencanto, da insatisfação e da miséria.
    Os curandeiros e adivinhos, especialmente os atuais neopentecostais, continuam agentes de coesão social ao aperfeiçoarem o trato com o sagrado objetivando o poder político.
    Talvez tardiamente, a Igreja percebeu a necessidade de mudança e introduziu programas televisados, salvo exceções, monótonos e com pouco movimento, dirigidos por padres e freiras engessados, sem a dinâmica requerida pelo processo social que demanda mudanças rápidas, na tentativa de ocupar espaços para enfrentar a agressiva presença das muitas igrejas neopentecostais que prometem, seguidamente, melhoria da vida aqui e agora.

    Sem análise de juízo de valor, o resultado tem sido desfavorável à Igreja católica. Os curadores e adivinhos das muitas igrejas neopentecostais atraem, continuamente, milhares de fiéis que doam além do dízimo, que efetivamente ajudam na construção de novas estruturas de poderes inseridos em várias estruturas sociais.