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quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Éticas e práticas de curas interligadas às linguagens-culturas



João Bosco Botelho

Algumas das dificuldades conceituais da ética médica têm sido estabelecer parâmetros para separar a má-prática dos maus resultados secundários aos incontáveis vetores de incertezas e variáveis que regem o funcionamento do corpo. Parece lógico pressupor que os conceitos que entendem e julgam as más-práticas e os maus resultados variam nos tempos e nas sociedades.
Os códigos que regulavam a profissão médica, desde o segundo milênio a.C., estão claramente ajustados às linguagens-culturas. Dessa forma, a ética médica é um produto do processo histórico da Medicina e do médico, ligada à ética e à moral, ao longo de mais de dois anos, como novo componente teórico, de caráter pedagógico e fiscalizador, para manter o principio fundamental que deve nortear as práticas médicas, sejam ou não de instrumental pesquisador: têm caráter libertador e devem acompanhar as mudanças sociais e tecnológicas na construção de um mundo melhor.
Nesse sentido e sob essa compreensão é válido relembrar alguns aspectos históricos.     Na Mesopotâmia e nas culturas que se desenvolveram mais intensamente, durante no segundo milênio a. C., no oriente, as práticas médicas estavam claramente dependentes das ideias e crenças religiosas por meio de muitos deuses e deusas taumaturgos. Não existia um processo teórico para explicar a saúde e a doença fora das ideias e crenças religiosas.
Nesse conjunto complexo, sem dúvida o médico, nominalmente reconhecido, fazia parte dos especialistas sociais. Existem fortes indicativos de um início consistente quanto a preocupação dos médicos quanto a:
– Entender, dominar e modificar a multiplicidade dinâmica das formas e funções do corpo;
– Estabelecer parâmetros do normal e patológico;
– Vencer as limitações impostas pelo determinismo da dor e da morte fora de controle. 
Assim, é possível identificar curadores que conviviam simultaneamente em torno de ações específicas para controlar a dor e aumentar os limites da vida vinculados às três Medicinas, cujos limites eram imprecisos:
– Medicina-divina: fortificada nos templos dedicados às muitas divindades, cujos agentes, sacerdotes e sacerdotisas, com forte destaque social, ofereciam a cura por meio de rezas e encantamentos sob a guarda dos deuses e deusas curadoras. Como uma facção muito forte, os adivinhos floresceram. Alguns registros nas tábuas de escrita cuneiforme atestam que os agentes das curas, na Mesopotâmia, além de encantadores, eram reconhecidos como exímios adivinhos. Essa característica dos curadores, na Mesopotâmia, não passou despercebida aos que redigiram alguns livros do Antigo Testamento, no período do cativeiro mesopotâmico, que demonstram forte influência da adivinhação.
– Medicina-empírica: nesse grupo, apesar de os agentes, homens e mulheres do povo, não exercerem as práticas nos templos, também com forte partilha com as ideias e crenças religiosas, estavam parteiras, erveiros, encantadores e benzedores. De tudo e todos interrompiam a caminhada para orientar, oferecer o tratamento.      

 – Medicina-oficial: tanto na Mesopotâmia, quanto em outras culturas que se organizaram e prosperaram, no segundo milênio a.C., os processos dos aprendizados, amparados pelos poderes dominantes, na formação do médico, estavam dentro dos templos das divindades curadoras mais importantes. Também por essa razão, é possível justificar, historicamente, os estreitos laços da Medicina-oficial com as ideias e crenças religiosas.