Amigos do Fingidor

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Janela da alma

David Almeida


A força do pensamento abre uma janela e o meu olhar vislumbra um horizonte que ninguém vê. O cego olha para o jardim e sente o esplendor das flores se abrindo, perfumando, colorindo seu mundo. O olhar de ninguém é só de ninguém. O meu olhar é só meu. O olhar do cego é projetado, do jeito que ele quer vê, no horizonte da noite, pela janela da alma.

O olhar? É um olhar que se perdeu e se aconchegou no mundo que seus valores viram. É a verdade, na sombra da luz, clareando os caminhos, onde passos pisarão e deixarão marcas fossilizadas, em algum lugar no tempo, onde a vida, por cada verdade viveu.

A vida de cada um é refletida no tempo e espaço determinado pelo olhar. Onde a vista vai é o limite da sua existência. Além do olhar não há nada. O pensamento voa sobre a luz do olhar, e o que vê é o mundo real da sua imaginação. Olhares se entrelaçam, se detectam; a luz, a escuridão podem ser as mesmas, mas a impressão de cada olhar é individual. Vejo-te da forma que meu olhar clareia a imagem que projetei, e que serve como mais um elemento para a composição do meu mundo real. Quantos olhares foram em vão, por não terem percebido, que a janela da alma tinha se fechado? Porque o engano sobrepujou a percepção; a vontade de ver o que não existe, conduz ao nada e um mundo em ruínas se desenha pela decepção. Mas, uma topada leva ao chão da realidade o cego que não quer ver.

O olhar está sempre buscando tudo o que a ele pertence, mas às vezes não vê o que procura, porque está dormindo e sonhando com aquilo que sempre quis ver, mas, nunca parou para olhar direito e o pesadelo segue noite adentro, pela madrugada, ao encontro do olhar da manhã.

Sem rumo é o olhar que vê o que não foi pensado; o que não tem registro referencia e esbarra no que não viu. Um só olhar é capaz de iludir, também, com a mentira emoldurando cílios, retinas e discursos, que pairam sobre multidões de desesperados, que têm a visão embaçada pela poeira levantada por uma sociedade desequilibrada; suja de olhares egoístas, gananciosos que globalizaram um mundo para poucos.

Pelo olhar tanto se ama como se odeia. Porém, mais vale o olhar que enche de amor um iluminado coração apaixonado, que um olhar cego de ódio, estacionado numa eterna escuridão.

No mundo, os olhares se cruzam, se experimentam. As janelas das almas se abrem e se fecham. Há olhares de chegada, onde tudo é surpresa e não discrimina nada; outros, de partida, frios, imóveis, que já viram tudo, construíram seu mundo ou nada fizeram... E se fecharam para sempre.