Amigos do Fingidor

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Fora de forma


Mauri Mrq

Certa feita, voltando do trabalho pela Henrique Martins, avistei uma antiga namorada, e era antiga mesmo, porque já havia se passado uns trinta anos, e percebi que ela ainda estava interessante, com um charme balzaquiano que me balançou. Ela em seguida entrou em uma loja de sapatos e eu fiquei ‘bicorando’ para forçar um encontro casual, o que deu certo. De primeira, ao abordá-la, não me reconheceu: também, barrigudo, careca e com inhaca de cigarro, não estava muito atraente, mas acabei dizendo umas gracinhas e ela abriu um belo sorriso e me deu aquela vontade repentina de comê-la. Sabe como é o charme feminino, mas seria impossível. Ela me disse que eu estava diferente, educadamente, pra não dizer que eu estava acabado, e ela sabedora do seu porte balzaquiano, com a carne rija de caboca protuberante e seios de látex, me humilhava sendo uma amazona. Conversa vai, conversa vem, acabamos combinando em nos comunicar para auxiliá-la na contabilidade de sua empresa, pois desconfiava estar sendo enganada pelo seu tradicional contador, desde a morte do seu marido. Uma mulher daquela não ia querer se trocar comigo, realmente havia estragado os anos da minha vida com tanta irregularidade mental, sem nenhuma preocupação com a saúde, mas sabe como é, mulher altera a ação regular do homem e resolvi me cuidar e melhorar a carcaça, ajustando o estilo da minha careca raspando a cabeça, fiquei moderno e ridículo, fazendo umas caminhadas, comprando umas roupas novas, iniciando um tratamento pra largar o cigarro, e isso sem a mulher me ter dado a mínima bola, mas sabe como é homem, iludido mais que mulher. Eu só havia combinado dar-lhe uma assessoria contábil e na mesma semana já estava me empolgando para tentar atraí-la.

No nosso primeiro encontro de trabalho, já percebi que ela começava a ficar à vontade comigo, mas sem nenhuma intensidade. E eu, também viúvo, já levando a vida pelas tabelas, comecei a me empolgar. De caminhadas resolvi entrar numa academia do bairro, queria acelerar minha forma física, e sem exame de saúde, comecei a puxar alguns pesos pra tentar resolver milagrosamente as pelancas dos meus braços e pelo menos enrijecer a minha barriga. Moral da estória: num dos exercícios, empolgado, acabei de me sentir mal, a pressão subiu, tive um AVC, fiquei com sequelas, com um lado paralisado, tive que antecipar minha aposentadoria, deixando meu emprego, e para complementar meu sustento, passei a ser contador da minha antiga namorada. E fico imaginando o que uma mulher é capaz de fazer sem fazer nada, com um homem que só pensa naquilo.