Pedro Lucas Lindoso
Preocupado
com tia Idalina, mandei um link do Google Meet para conversar on-line com
titia. Perguntei-lhe se já tinha se vacinado. Ela me disse que estava na
próxima etapa. Estavam vacinando os maiores de 80 anos. Ela insiste em dizer
que tem só setenta. Abomina a palavra idosa. Gasta sempre seu francês e se diz
somente um pouquinho “agée”. Não é verdade.
Idalina
já estava na faculdade quando os russos lançaram o Sputnik, em 1957. Idalina
tem sim, mais de oitenta. É ela mesma
quem conta essa história:
– O
Sputnik foi o primeiro satélite artificial da Terra. Foi lançado pela União
Soviética em outubro de 1957. Jamais me esqueci disso. Namorava um broto legal
comunista.
Quem
ainda vivo e com menos de oitenta anos chama ex-namorado de broto legal?
E
continuou dizendo que o satélite orbitou a Terra por seis meses antes de cair.
Que o tal “broto legal” sugeriu que ela estudasse russo pois iriam se casar e
morar na União Soviética, como se chamava a Rússia antes da queda do Muro de
Berlim.
Nas
primeiras aulas de russo aprendeu que os sobrenomes na língua russa também têm
formas femininas que terminam com “ova”, finalizados em “a”, assim como a
maioria dos substantivos femininos.
Concluiu
que se fosse morar na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas seria chamada
de Santosova. O sobrenome do “broto legal” comunista de Idalina era Santos.
Idalina não gostou. Desistiu das aulas de russo e do tal broto.
Se pelo
menos pudéssemos adotar o codinome dele – Sputnik – eu seria conhecida como
Sputnikova. Mais apropriado, segundo titia. Na clandestinidade, o rapaz era
conhecido como Sputnik.
Disse a
ela que não diria a ninguém que ela é da época em que Sputnik era somente
satélite e não vacina.
– Pois
é, retrucou. Os russos são “experts” em vacinas. A tal Sputnik é uma das
melhores produzidas contra esse terrível corona. O Brasil deveria ter feito
como a Argentina. Comprado a vacina dos russos. Mas parece que ainda vão
comprá-la. Eu vou esperar a chegada das sputniks, as vacinas russas. Elas são
bem melhores que essas que estão aplicando no Brasil.
Eu
disse a titia para deixar de pavulagem e ir já se vacinar. Esse vírus é letal e
perigoso para a terceira idade. Como ela gosta de trocadilhos, brinquei com
ela:
– Esperar uma ova. Vá se vacinar, Sputnikova.