Amigos do Fingidor

terça-feira, 8 de junho de 2010

O estranho caso da Vila da Barra – 3

Marco Adolfs


Comecei a sentir enorme dificuldade em caminhar, devido às subidas e descidas pronunciadas daquelas ruas sem calçamento e repletas de buracos com lama. Mas o que mais me impressionou nas cercanias da cidadela foi a quantidade significativa de umas aves de penas negras a circularem pelos ares ou mesmos rente a nossos pés. Meu companheiro explicou tratar-se dos urubus, uma ave de rapina da região.

Após muito subir e descer, suando as bicas sob um sol inclemente, finalmente atingimos uma parte da cidade onde a temperatura se apresentava mais amena. Atravessávamos por uma velha ponte de madeira por baixo da qual um braço de rio escuro deslizava placidamente saindo do interior da selva fechada. Não pensei duas vezes e, ao chegar do outro lado da ponte, convidei meu acompanhante para refrescarmos nossas cabeças e pés naquele riacho maravilhoso. Deliciosamente revigorados, retomamos a caminhada em direção ao meu destino, que, segundo o senhor Salgado, ficava a uns cinquenta metros em linha reta de onde estávamos. “Passando a próxima ladeira!”, disse, rindo.

Enquanto caminhava, os pensamentos se revolviam em minha cabeça, misturados que estavam com a dúvida e, porque não dizer, com a ousadia, dos meus reais propósitos naquela localidade. Trazia comigo uma carta de apresentação dos donos de uma fábrica de cerâmica portuguesa – a Companhia Nacional de Cerâmica Lisboeta –, que estavam interessados em investir, segundo eles, “em um novo e impressionante negócio que iria mudar o mundo”. Já havia estado naquela vila e pago o comerciante português para hospedar-me e ajudar-me no que fosse possível. Imaginava que esse homem poderia não saber de maiores detalhes sobre o negócio que havia por trás da minha ida àquele lugar. Por isso, quando finalmente cheguei a casa deste – incumbido de uma missão que julgava espinhosa e delicada –, pesavam-me as dúvidas sobre o que poderia acontecer no momento em que ele soubesse o que faríamos.

O senhor Salgado nos fez as prévias apresentações e despediu-se. Então pude me identificar melhor, como sendo “doutor Eurico Pompéia... O senhor a ser esperado naquela casa, trazendo uma carta de apresentação dos donos da...”. Mal pude terminar minha apresentação e fui interrompido pelo senhor Lourenço, um homem baixinho, barrigudo e de aspecto simpático e bonachão, que tanta alegria externou por minha chegada, “já esperada para qualquer momento”– disse –, que fiquei um pouco constrangido. Mas, aos poucos, desprendia-me de todos aqueles pensamentos de insegurança em relação a ele. De imediato passei a gostar daquele homem. Assim que adentrei o recinto que me parecia ser a sala principal do enorme sobrado de madeira onde morava o português, fui envolvido por seu jeito hospitaleiro. Esclareceu logo saber da minha chegada por esses primeiros dias do mês em curso e que por causa disso havia preparado um cômodo da casa para ficar a minha inteira disposição.

(Continua na próxima terça)