Francisco
Vasconcelos
A heráldica lembrança do Poeta
se eterniza
nos poemas que deixou.
Nos poemas
e na sempre presença de seus gestos,
de seu
estranho jeito de ser,
exigente na
postura
e no inimitável modo de olhar e sentir o mundo.
Quão diferente foi ele na ortodoxia de seus
quereres,
na curiosa excentricidade de seus costumes
e, sobretudo, na indiscutível perfeição de seu fazer
poético.
Cauteloso artesão das letras,
os versos que prodigamente nos deixou
têm sabor de luas dadivosas,
dessas que nos inundam a alma
de uma inarredável vontade de querer mais e mais.
Exímio alquimista do belo,
era do mais íntimo de seu sensível ser
que lograva transformar em poesia,
até mesmo o insólito e desprezível,
como fez ao lamentar a sorte dos indesejáveis
moradores
dos esconderijos feitos ao pé das velhas e românticas
mangueiras
da Rua da Conceição.
(onde irão morar os ratos, de ventre gordo e
pelado?)
De tais mangueiras,
chegou, até mesmo a ouvir a saudosa conversa,
nos seus lamentos e nas ternas reminiscências casimirianas
.
(Oh que saudades que tenho...)
E era tal a lembrança que tinha da Rua
da Conceição,que fico a imaginar ter sido também ali por perto que,
cauteloso e cismarento,
escondia seus ardentes desejos do solitário
e consciente
eremita que fora a vida inteira.
Na abrangente alquimia de seus versos,
com um simples giro do polegar nas pedras de seu
isqueiro
despertava miríades de estrelas,
logo surgindo (só para vê-las) a bailarina chama
na qual, compulsiva e inevitavelmente
se comprazia em atender aos nicóticos caprichos
do seu mais frequente e traiçoeiro amigo,
precursor da agonia.
E as recordações que tinha ele das treze
casas da rua,
numa das quais morou por muito tempo!
Como esquecer a terna e doce balada que dedicou
à Senhora
Dona Donana, ex-dona do quarteirão?
Ah, Poeta, quanta saudade plantaste com teus versos.
Agora, velho amigo,
livre das amarras que te continham,
é com a certeza do eterno que segues o teu caminhar.
E vais vestido exatamente como gostarias de ir:
paletó
feito de brumas,
camisa
de neblina,
cachecol
à moda russa e, na lapela,
um breve floco de nuvens.
Vai, poeta!
Os que ficamos, por muito tempo
ouviremos embevecidos
os maviosos sons de tua frauta de barro...
Brasília/outubro/2012
Tarde de sábado, julho, 2006, no El Perikiton. Da esquerda para a direita: Zemaria Pinto, Luiz Bacellar, Tenório Telles e Mauri Marques. |