João Bosco Botelho
Nos primeiros anos da década de oitenta, como reação aos
excessos terapêuticos das práticas médicas, se iniciou em algumas universidades
europeias, em especial a Universidade de Paris V (Pierre e Marie Curie), onde
conclui o doutorado, em 1981, a proposta para incluir a História da Medicina no
currículo.
Em Manaus, a primeira ideia para a inclusão da Disciplina da
História da Medicina no currículo do Curso de Medicina da antiga FUA, nasceu entre
os anos de 1984 a 1986, junto ao Projeto Eden, do Departamento de Medicina
Especializada, quando foram levantados dados sociais e médicos em Coari e no
bairro Novo Paraíso, na periferia urbana de Manaus: ficou patente que grande parte
da medicina praticada no hospital universitário estava distante da compreensão
de saúde e doença das três mil pessoas entrevistadas.
Tudo começou no Departamento de História, da UFAM, com a
professora Vânia Tadros orientando as reuniões para discutir o programa, a
metodologia e a bibliografia. Finalmente, a Disciplina de História da Medicina foi
oferecida em caráter optativo.
O ensino da História da Medicina possibilita analisar a
tendência para substituir os conceitos positivos da imobilidade da saúde e da
doença pela convicção da existência do equilíbrio dinâmico entre ambas, onde a
relação do homem com a totalidade social é estruturante. A certeza do sociocultural
produzindo doença está presente nos livros sagrados, escritos há quatro mil anos.
Naquelas épocas, os legisladores utilizaram os seus poderes disponíveis e
interferiram nos hábitos coletivos de populações inteiras. Com essa atitude
conseguiram determinar, ao longo dos séculos que se seguiram, modificações na
cadeia epidemiológica de muitas doenças.
Nas
diversidades de apresentações, as doenças acompanham o homem no processo de
humanização. Sob este ponto de vista é possível entendê‑las como formas de
expressão da vida, onde cada cultura cristaliza as próprias condições de luta
para o enfrentamento.
Com as pressões impostas pela industrialização acelerada do
Ocidente, o ensino da medicina passou a considerar somente como verdadeiro e
produtor de saúde as relações científicas vindas dos laboratórios de pesquisa. Tudo
apoiado na certeza de que a utilização de aparelhos para intermediar a ação
médica seria responsável, em futuro muito próximo, pela melhoria das condições
de saúde do homem.
Os anos que se seguiram mostraram exatamente o contrário: a
melhoria da qualidade da vida e a longevidade não estão atreladas à
parafernália da tecnologia médico‑industrial e à supermedicalização e sim às
medidas básicas de saneamento, moradia, educação, trabalho e lazer. Nas
palavras de Jacques Le Goff: "A doença não pertence somente à história
superficial do progresso científico e tecnológico, mas à estrutura profunda dos
saberes e práticas ligadas às estruturas sociais, às instituições, às
representações e às mentalidades".
De
lá para cá, o ensino da História da Medicina alcançou as faculdades de medicina
em Manaus. Após a minha aposentadoria como professor titular, na UFAM, o Prof.
Dr. Rodolfo Fagionato, ex-orientando no Mestrado em Cirurgia (UFRJ) e no Doutorado
em Biotecnologia (UFAM), assumiu a Disciplina e continuou o ideário acadêmico.
Prosseguindo o processo acadêmico, vários professores
fundaram a Sociedade Amazonense de História da Medicina, no dia 18 de janeiro
de 2013, no auditório do Laboratório Reunidos.