João
Bosco Botelho
Os sistemas de saúde dos países ocidentais têm estimulado, nos últimos
anos, o uso de práticas terapêuticas alternativas. Entre as opções, a
homeopatia mantém a preferência.
Os
princípios que regem a homeopatia foram teorizados por Christian
Friedrich Samuel Hahnemann (1755-1843).
Ao traduzir a obra As leituras da Matéria Médica de
Cullen, Hahnemann atentou à descrição dos efeitos da China
officinalis ou Casca
do Peru, planta usada pelos indígenas para tratamento do paludismo ou malária. Na mesma
página, anotou critica ao autor do livro que defendia a ação
terapêutica da quina associada ao sabor amargo. Após
ingerir a quina, sentiu os mesmos sintomas dos doentes com malária.
Hahnemann teorizou que
não era correto considerar que, por ser amarga, a quina curasse a malária, mas em
razão de causar efeitos semelhantes aos da doença, se tomada por alguém
saudável. Esse pressuposto gerou o Princípio da Semelhança
ou similia similibus curantur (semelhante se cura pelo semelhante).
Naquela época, a medicina estava
fortemente atada à influência cartesiana: o corpo aceito como grande máquina,
onde as doenças seriam desajustes nas engrenagens. Desta forma, se o paciente
tinha febre, o remédio era a sangria, que deveria reverter o quadro após a saída
do veneno interno. Contudo, o mais dramático: a sangria só era interrompida
quando a pele doente estava "pálida como a porcelana chinesa".
A questão da eficácia dos remédios homeopáticos tem
sido retomada de tempos em tempos. Nos anos oitenta, no Governo Miterrand, na
França, a pesquisa coordenada pelo epidemiologista Daniel Swartz recebeu
destaque mundial, sendo publicada na respeitada revista inglesa The Lancet.
Os testes clínicos foram realizados em treze
hospitais, na França, utilizando as substâncias Opium e Raphanus, para
estimular o metabolismo intestinal após diferentes formas de cirurgias no
abdome. Após a análise dos resultados, os pesquisadores concluíram que não
houve diferença significativa entre os grupos estudados, isto é, os pacientes
que ingeriram o placebo (substância sem qualquer efeito, como um comprimido de
açúcar) e o remédio homeopático; os dois grupos recuperaram o funcionamento
intestinal em médias iguais após as cirurgias.
Outra
experiência clínica, realizada em São Paulo, coordenada pelo Prof. Carlini, na
Escola Paulista de Medicina, realizou o estudo comparativo duplo cego de
pacientes com insônia. O resultado foi igualmente frustrante: não ocorreram
diferenças na indução do sono nos dois grupos estudados.
A
homeopatia foi introduzida no Brasil, em 1840, pelo comerciante francês Benoit
Mure, discípulo de Hahnemann. A disputa entre a alopatia e a homeopatia, de
certa forma, foi marcada pela conquista do mercado consumidor. Com avanços e
recuos a homeopatia se firmou gradativamente ate o reconhecimento pelo CFM, em
1980, e pela Previdência Social em 1985.
E inegável que existem descaminhos da
prática médica alopática. O mercantilismo, sob a égide da propaganda, acoplada
ao fantástico aparelho médico-hospitalar, tendem a separar o médico do objeto
da sua prática – o doente – com enorme despesa desnecessária, aproximando a
Medicina do grande comércio.
Mesmo assim, em comparação aos anos
1980, especialmente na França, quando as farmácias homeopáticas se
multiplicaram, com os doentes temerosos pela agressividade de alguns fármacos
alopáticos, nos dias atuais, ocorreu a desaceleração do encanto pela
homeopatia.