Amigos do Fingidor

quinta-feira, 28 de abril de 2016

Filhos



Paulo Sérgio Medeiros

É chegado o momento de mudar o disco, o ritmo dos dias – tem a partir do parto – a cadência dos choros da inocência. Planejados ou frutos de uma felicidade fugaz em braços de carnavais, eles chegam como uma bomba-relógio subvertendo todo o nosso relógio biológico. Filhos...

Pedaço de mim,
Metade afastada de mim.

Berçando-os baixinhos em versos translúcidos de amor trocamos o dia pela noite, pernoites... Incontáveis pernoites... Trocamos fraldas, mama daqui, mama dali, mamadeira, haja mamadeira, ufa! É madeira de dá em doido. Filhos...

Pedaço de mim,
Metade exilada de mim.

Vêm os primeiros dentes, dói... Dói na gente. Dentes de leite, um sorriso, um deleite. Vêm os primeiros passos inseguros, os seguramos, os levantamos e paramos para vê-los se equilibrando na metáfora da vida. Filhos...

Pedaço de mim,
Metade arrancada de mim.

Eles nos fazem vagar em sonhos quiméricos prenhe de esperança escoltada pelo medo da perda e a coragem de quem ama como um bicho. Medo e coragem, essa antítese ambulante moldurada de porto-seguro disposta a extremos incondicionais. Filhos...

Pedaço de mim,
Metade amputada de mim.

Ensinamos-lhes o beabá e eles nos ensinam a conjugar verbos do tipo: perdoar, dividir, e sobretudo o verbo amar. Eles crescem e não podemos mais respirar por eles. Mas como bons para-raios que somos estaremos sempre no alto de um arranha-céu desviando-lhes, ou pelo menos tentando, de todas as descargas desse moinho chamado mundo. Filhos...

Pedaço de mim,

Metade adorada de mim.