Amigos do Fingidor

terça-feira, 10 de maio de 2016

Cleóbulo, o pávulo



Pedro Lucas Medeiros

Dizem que o que mata o caboclo é a pavulagem.  O velho e bom dicionário Aurélio, define pávulo, ou pábulo, como fanfarrão e gabola. Mas nós, amazonenses, sabemos que a pavulagem transcende a fanfarronice e a gabolice. Além de convencido e blasonador, o pávulo quer ser, sem o ser. Enfim, a pavulagem é uma instituição.
Cleóbulo, finado servidor da Prefeitura de Manaus, exerceu a pavulagem em alto estilo e dela foi vítima, coitado.
Entrou para os quadros da municipalidade em questionável concurso público no cargo de auxiliar de portaria. Como tinha o curso de técnico em contabilidade, e se dizia “perito contador”, foi logo galgando a função de auxiliar de contabilidade. Isso tudo antes da Constituição Federal de 1988, quando o Ministério Público era uma reles promotoria, sem poder para fiscalizar a lei e os desmandos governamentais com a eficiência dos dias de hoje.
Um dos primeiros carros de Cleóbulo, o pávulo, foi um Monza de segunda mão sem ar-condicionado. Ele andava com as janelas fechadas e um ventilador de pilha a lhe amenizar o calor. Quem duvidaria que aquele automóvel fosse desprovido de ar?
Sempre bem vestido, de sapatos engraxados. Cleóbulo engraxava principalmente a sola dos sapatos, para ter aparência de novo. Morador do Bairro da Compensa, alardeava habitar para os lados da Ponta Negra. Certa vez, tirou férias e disse que ia ao Rio de Janeiro. Escondeu-se em um sítio, do outro lado do rio, no Município do Careiro. Coisas de Cleóbulo, o pávulo.
Com a velhice e prestes a se aposentar, gabava-se que seu destino final era o Cemitério São João Batista, local onde são enterrados os amazonenses ilustres, como ele. Como se sabe o tal cemitério está com lotação esgotada. Hoje a maioria dos sepultamentos é feita no cemitério do Tarumã.
– Morro, mas não vou para o Tarumã, dizia ele. É longe e sem tradição.
De fato, a família de Cleóbulo tem um jazigo no São João Batista. Lá estão seus avós, pais e tios. Quem é a responsável é sua prima Clarinda. Função herdada de seu pai Clemilsom, tio de Cleóbulo e o último da família a falecer.
Pois bem, Clarinda alertou Cleóbulo, contemporâneo de Clemilsom Filho, que quem morrer primeiro é bom esperar cinco anos. Senão vai para o Tarumã.
Ao saber que seu primo Clemilson Filho estava gravemente enfermo, teve um enfarte fulminante e morreu. Possivelmente apavorado em ser enterrado no Tarumã. Em sua lápide está escrito:
Aqui jaz Cleóbulo, o pávulo. Descanse em paz.