Pedro Lucas Medeiros
Dizem que o que mata o caboclo
é a pavulagem. O velho e bom dicionário Aurélio,
define pávulo, ou pábulo, como fanfarrão e gabola. Mas nós, amazonenses,
sabemos que a pavulagem transcende a fanfarronice e a gabolice. Além de convencido
e blasonador, o pávulo quer ser, sem o ser. Enfim, a pavulagem é uma
instituição.
Cleóbulo, finado servidor da
Prefeitura de Manaus, exerceu a pavulagem em alto estilo e dela foi vítima,
coitado.
Entrou para os quadros da
municipalidade em questionável concurso público no cargo de auxiliar de
portaria. Como tinha o curso de técnico em contabilidade, e se dizia “perito
contador”, foi logo galgando a função de auxiliar de contabilidade. Isso tudo
antes da Constituição Federal de 1988, quando o Ministério Público era uma
reles promotoria, sem poder para fiscalizar a lei e os desmandos governamentais
com a eficiência dos dias de hoje.
Um dos primeiros carros de
Cleóbulo, o pávulo, foi um Monza de segunda mão sem ar-condicionado. Ele andava
com as janelas fechadas e um ventilador de pilha a lhe amenizar o calor. Quem
duvidaria que aquele automóvel fosse desprovido de ar?
Sempre bem vestido, de sapatos
engraxados. Cleóbulo engraxava principalmente a sola dos sapatos, para ter
aparência de novo. Morador do Bairro da Compensa, alardeava habitar para os
lados da Ponta Negra. Certa vez, tirou férias e disse que ia ao Rio de Janeiro.
Escondeu-se em um sítio, do outro lado do rio, no Município do Careiro. Coisas
de Cleóbulo, o pávulo.
Com a velhice e prestes a se
aposentar, gabava-se que seu destino final era o Cemitério São João Batista,
local onde são enterrados os amazonenses ilustres, como ele. Como se sabe o tal
cemitério está com lotação esgotada. Hoje a maioria dos sepultamentos é feita
no cemitério do Tarumã.
– Morro, mas não vou para o
Tarumã, dizia ele. É longe e sem tradição.
De fato, a família de Cleóbulo
tem um jazigo no São João Batista. Lá estão seus avós, pais e tios. Quem é a
responsável é sua prima Clarinda. Função herdada de seu pai Clemilsom, tio de
Cleóbulo e o último da família a falecer.
Pois bem, Clarinda alertou
Cleóbulo, contemporâneo de Clemilsom Filho, que quem morrer primeiro é bom
esperar cinco anos. Senão vai para o Tarumã.
Ao saber que seu primo
Clemilson Filho estava gravemente enfermo, teve um enfarte fulminante e morreu.
Possivelmente apavorado em ser enterrado no Tarumã. Em sua lápide está escrito:
Aqui jaz Cleóbulo, o pávulo.
Descanse em paz.