Jorge Tufic
A
Legislação Teórica
A conceituação antiga
e a contemporânea
Nos
dois quadros que esquematizam os gêneros literários (o da Antiguidade e o
Contemporâneo), observa-se que todas as transformações processadas em dois
milênios, não atingiram o essencial.
Segundo
Nelly Novaes Coelho, “os gêneros continuam a ser poesia, prosa e teatro, porque são expressões das
experiências humanas básicas: a vivência “lírica” (o Eu voltado para si próprio
e suas emoções, cuja expressão essencial é a poesia); a vivência épica (o Eu em
confronto com o mundo social, e cuja expressão natural é a prosa) e a vivência
“dramática” (o Eu entregue ao espetáculo da Vida, no qual ele próprio é
personagem e cuja expressão básica é o diálogo).
A
esses três gêneros o nosso tempo tende a acrescentar mais um: o da crítica
Estética, expressão da vivência eu/texto,
dinamizada pela inteligência analítica e crítica. Mescla de ciência e intuição,
a Crítica é uma expressão ambígua que depende de um conhecimento racional mesclado a um pensamento criador. Isto é, participa da objetividade exigida pela teoria e da subjetividade natural à Arte.
As
demais transformações, registradas pela atual conceituação dos gêneros, são contingentes, isto é, efêmeras, porque
representam “momentos” de evolução da Humanidade e por isso estão destinadas a
uma contínua mudança.
A
grande alteração deu-se, sem dúvida, ao nível da legislação teórica que, nas diferentes épocas que nos precederam,
se exerceu tiranicamente sobre a criação literária. Hoje já não há mais regras
ou normas absolutas a que a liberdade do artista deva se submeter. Como
sabemos, todas as leis, normas, regras e fronteiras foram postas em questão
pelo nosso século, tanto ao nível da vida humana e social, quanto ao nível da
Arte (ou do Pensamento em geral). Daí a liberdade, ou melhor, a anarquia de
formas que se expressa na “cultura de mosaico” característica do nosso tempo.
A
única “norma” que jamais mudou (e que em cada época foi codificada de um modo)
é a da coerência orgânica do discurso
e sua forma significante. Da unidade
essencial de ambos resulta a verdade, a força e a beleza do texto ou da obra
literária. No alcançar tal unidade revela-se o maior ou menor gênio do poeta,
do ficcionista e do dramaturgo.
Foi
na busca dessa coerência ou unidade interna do texto literário, que os gregos estabeleceram
determinados tipos de verso para determinados tipos de experiência expressa. A
cada vivência corresponde uma linguagem específica e um ritmo que lhe é
essencial. Foi também em busca dessa unidade que retóricos de todos os tempos
procuraram defender determinadas “formas” como ideais... Mudados os ideais,
mudam-se as formas...
Nos
dois quadros acima referidos, o gênero poesia dispõe das formas Lírica e Épica,
e das espécies literárias como elegia, canção, soneto, idílio, balada, ode etc.
A natureza de sua linguagem é poética, e seu objeto se encontra no mundo lírico
(o mundo do “eu”) ou no mundo épico ou heróico (o mundo das grandes ações).
Temos, deste modo, que gênero, forma, espécie, natureza da linguagem e objeto
(ou fonte da matéria) são os componentes ou partes em que se divide,
modernamente, o estudo da Poesia. Na Antiguidade, porém, em razão da própria
época e de seus costumes, o gênero aparece no lugar da forma, e a maneira da
“imitatio”, passando pelo objeto da “imitação” ou FACE da realidade imitada,
condiciona ou está condicionada à reação do leitor (ou espectador). Exemplos
(resumos dos quadros):
GÊNERO
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FORMAS
LITERÁRIAS
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MANEIRA
DA “IMITAÇÃO”
|
OBJETO
DA “IMITAÇÃO” ou FACE da realidade imit.
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REAÇÃO
DO LEITOR
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Lírico
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Ditirambo
(poema lírico breve: culto de Dionísio)
Elegia
(=pranto)
Hino
(=canto a divindade) Canção (=canto bodas ou dramático etc)
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cantada
– versos pentâmetros ou elegíacos; sáficos; alcaicos etc
(ritmo
leve)
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O
mundo interior: o “eu” do poeta em face de suas emoções e do mistério da
vida. A “persona” em face da vida.
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Emoção
que leva o leitor a se concentrar.
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Épico
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Epopeia
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Recitada
– versos hexâmetros (ritmo que corresponde ao tom grandioso, acima do tom
comum).
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O
mundo exterior ao poeta: o mundo das grandes ações, dos grandes gestos que
atuam no mundo exterior e o transformam. A vida heróica ativa.
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Admiração
que leva o ser a se expandir.
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O gênero Poesia, segundo a conceituação
contemporânea:
GÊNEROS
|
FORMAS
LITERÁRIAS
|
ESPÉCIES
LITERÁRIAS
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NATUREZA
DA LINGUAGEM
|
OBJETO
(ou fonte da “matéria”)
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Poesia
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Lírica
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Elegia Ode
Canção Balada
Soneto Madrigal
Idílio etc.
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Linguagem
Poética
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O
mundo lírico (=o mundo do “eu”).
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Épica
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Epopeia
homérica, “Canções de Gesta”, Poemas épicos renascentistas, Poesia social
etc.
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O
mundo épico ou heróico (=o mundo das grandes ações).
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