João Bosco Botelho
Na sociedade grega, especialmente na do
século 4 a.C., políticos compreendiam a necessidade de organizar as cidades à
semelhança dos corpos saudáveis, como se fossem organismos vivos. Ao contrário,
a desorganização, causando tensões na maior parte da população, gerando ou se
aproximando do caos, era considerada sinônimo de doença.
Aos gregos daquele tempo não seria possível
administrar a cidade com competência satisfazendo as aspirações coletivas de bem-estar
se as doenças de qualquer tipo fossem prevalentes. O administrador, o político competente,
estava identificado, de modo obrigatório, naquele que poderia curar os sinais
de qualquer desordem no ritmo urbano, capaz de determinar prejuízo às pessoas,
impedir o sossego coletivo, as trocas comerciais e as relações com as ideias e
crenças religiosas.
Tanto na administração laica do político
quanto na dos sacerdotes e sacerdotisas, no mundo mágico da adivinhação
oracular, a passagem da ordem (saúde) à desordem (doença), envolvendo mudanças
nas coisas e nos acontecimentos, implicando riscos à saúde e à vida, estava
claramente em polos opostos.
O poder de curar pessoas e sociedades, evitando
a enfermidade e adiando a morte, tem sido historicamente utilizado pelo poder
político, como mecanismo de coesão e controle social. Nessa esteira, sem
dúvida, exigida pelos cidadãos nos quatro do mundo, obrigam que os
administradores e políticos tanto nos macros quanto nos microssistemas,
continuamente, como primeira obrigação, ofereçam à cidade médicos, hospitais, ambulatórios
resolutivos e de fácil acesso, que são sempre mostrados à população como provas
da competência gerencial. Desse modo, como na Grécia do século 4 a.C., hoje,
respeitando as devidas proporções, construir hospitais, ambulatórios e
contratar médicos continua sendo mostrado aos eleitores como indicativo de que
podem confiar nesse ou naquele político.
É possível teorizar que esse elo motivador
para a consolidação dessa extraordinária associação entre competentes sistemas
de saúde e boa administração pública também esteja relacionado com as
compreensões da morte. O sofrer e a morte da pessoa amada determinam
transtornos complexos, em diferentes níveis do corpo, trazendo incontáveis
sinais físicos de desconforto, variando em cada pessoa. O sistema nervoso
central libera substâncias que alteram o ritmo biológico e interferem para
amenizar a baixa da defesa imunológica inata. Esse terrível padecer, também entendido
como sensação de perigo iminente, provoca mudanças nos ciclos do sono, da fome,
da sede, da libido e da afeição. Logo, o político que consegue transmitir a
mensagem pública de que consegue amenizar esse sofrimento, por meio da oferta
de hospitais, ambulatórios e médicos, invariavelmente, é identificado como
confiável.
Continuando a teorização, parece lógico pressupor
que as atitudes específicas, usadas no enfrentamento da dor temida, minorando o
sofrimento do homem e da mulher, tenham sido valorizadas e, continuamente,
aperfeiçoadas pela ordem social. As ações humanas transformando a natureza para
atenuar o desconforto, são imperativas! Estão ligadas diretamente aos
mecanismos neuroquímicos que modelam e controlam todos os corpos dos seres
vivos, em especial, os humanos.
Na atualidade, a compreensão da sociedade
organizada sem as dores da miséria dos deserdados que clamam por água e comida,
como na Grécia antiga, está ligada aos políticos que zelam pelo bem público e
buscam solução para curar os sofrimentos.