Amigos do Fingidor

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Prosa & Panela – 6


                                                                                                      Tainá Vieira

Cozinhar é uma tarefa intensamente prazerosa, não importa o que iremos cozinhar. Já disse que preparar o alimento é melhor do que comê-lo. O cheiro da comida é sexy e tudo que é sexy dá prazer.  Já notaram que eu sempre associo a comida ao sexo? Na verdade, não sou eu, essa associação ou comparação está aí desde os primórdios dos tempos. Então, Adão e Eva viviam felizes e sem pecado no Jardim do Éden, andavam nus e não sentiam vergonha, até que apareceu a serpente e fez a cabeça da coitada da Eva que comeu do fruto proibido e ainda ofereceu ao Adão. Esse fruto proibido era a maçã, que retém o poder simbólico de fruta do conhecimento e da vida eterna e também da sexualidade, da fertilidade e do erotismo: uma maçã redonda, suculenta e fresca, tal qual um seio. E por aí vai, há inúmeros alimentos, frutas, legumes, grãos, peixes, tão eróticos quanto a maçã.  
Meu malvado favorito, o poeta Luiz Bacellar escreveu Sol de Feira, uma obra composta por 50 poemas, todos na forma de rondel, onde ele usa as frutas para cantar a sensualidade feminina. Ele diz que o limão é um “verde mamilo” e Camões já havia dito isso também muitos séculos antes de Bacellar: “os formosos limões ali cheirando, / estão virgíneas tetas imitando.”
Dizem que alguns alimentos têm cheiros iguais aos dos órgãos genitais: bacalhau, coalhada... E há outras partes do corpo que exalam um cheiro igual ao de comida.  Li isso em algum lugar. Uma amiga minha disse que às vezes suas axilas ficam com cheiro de sushi; eu falo pra ela lavar com limão para tirar o cheiro do sushi. Como já disse por aí, a comida faz parte da nossa vida do nascer ao morrer; ela está em todos os momentos. Geralmente, o primeiro encontro de um casal é um jantar romântico, um cardápio leve, bebida mais suave: ninguém quer se embriagar ou se empanturrar de comida no primeiro encontro.
  Nos encontros românticos – que pode dar em namoro, noivado e casamento –, que podem começar em uma mesa e terminar em uma cama, o jogo da sedução deve reinar. É um encontro para seduzir em todos os sentidos. Tudo tem que estar em harmonia, desde o ambiente ao modo como o casal mastiga. Percebe- se a fome de desejo do homem ou da mulher pelo jeito como ambos abocanham os alimentos. O gastrônomo e escritor culinário francês Grimod de La Reyniere disse que as únicas coisas essenciais a um “ninho de amor” eram um fogão e um colchão. Ele tem razão. Quando se está apaixonado, o indivíduo quer agradar a seu parceiro. Até quem nunca cozinhou torna-se chef com a mesma rapidez que foi tomado pela paixão. Não se cansam de cozinhar, adoram preparar pratos novos, doces, até criam suas próprias receitas. No entanto, quando o encanto acaba, até o jeito que a pessoa mastiga incomoda: não tem nada mais irritante do que ficar ouvindo algo duro ser triturado nos dentes de alguém, e não existe nada mais nojento do que ver alguém palitando os dentes na sua frente, arrotando na sua cara, ou mesmo receber um beijo com gosto de alho ou de cebola. Quando há amor, o alho cheira a menta, quando não há, nossa, pulemos para o último parágrafo.

É costume, no dia dos namorados, presentear quem se ama com uma caixa de chocolate com um laço de fita vermelha. Até o formato da caixa ou do chocolate simboliza o amor: geralmente as caixas têm formato de coração, beijo... Nas lojas de produtos eróticos, os chocolates têm formato dos órgãos genitais. Comida e sexo estão ligados do nosso começo ao nosso fim. O homem não foi feito pra viver sozinho e nem sem comida - tampouco sem amor ou sem sexo.  Há casais que se chamam por nomes comestíveis: docinho, mel, bombom, delícia e há uma infinidade de nomes doces e melosos que até enjoam e engordam... Tudo está relacionado, “quando a mulher começa a detestar o modo como ele mastiga, ela já o ama menos.”