Amigos do Fingidor

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Prosa & Panela – 7



Tainá Vieira

Não existe comida mais saudável e deliciosa do que um peixe. Com exceção do pacu, o único peixe de que eu não gosto. Peixe é delicioso, mesmo temperado apenas com sal. Mas existem outros que só ficam bons quando são temperados à base de ervas finas, como o caso o salmão. E vocês acreditam que tem gente que não gosta de peixe? Meu Deus, eu acho que esse povo que não come peixe tem sério problema com a vida. Conheço gente que tem até nojo de peixe, que não suporta o cheiro de peixe. É bem verdade que o cheiro de peixe não é tão aromático assim, e também existem certos peixes bem gordurosos, que enjoam bastante. Os pacus são bem gordurosos, mas não é a gordura que me desagrada, é o cheiro dele que me causa repugnância.
 Deixando os chiliques de lado, os peixes têm uma importância bem significativa na região amazônica, para o seu povo. Era o pirarucu salgado ou o surubim a alimentação dos seringueiros no período da borracha. Os seringueiros eram obrigados a comprar sua alimentação no armazém dos coronéis, principalmente o peixe salgado e a farinha.  Esse peixe salgado, no caso o pirarucu, após ele ser tratado, ter retiradas suas escamas – que são lindas e servem para fazer artesanatos, como brincos, por exemplo –, cortam-no em postas finas, ou nem tão finas, e passam-lhe sal, bastante sal mesmo, e colocam essas postas ao sol, para elas ficam secas e salgadas. Os seringueiros comiam com o chibé, que é a farinha na água, com açaí e farinha, com castanha do brasil. Nossa, isso é muito bom, já comi... Na época dos seringueiros não havia muita receita do peixe salgado; hoje se pode fazer pirarucu de casaca, onde o segundo ingrediente importante para essa receita é a banana; pirarucu à portuguesa, onde o segundo ingrediente é a batata; desfiado de pirarucu nem precisa de receita para fazer; e pirarucu à moda do seringueiro, onde o segundo ingrediente é a castanha do brasil. Tudo isso se pode fazer com as postas de pirarucu seco; só serve se for seco.
 Meu pai-avô fazia isso, essas postas de pirarucu ficavam expostas ao sol, no quintal de casa, perto da cozinha, é claro, e de vez em quando eu ia lá e pegava uma lasquinha e comia cru mesmo. Sempre gostei de comida salgada, era delicioso e eu achava muito divertido fazer isso, é como se pegasse um biscoito do pote, bem normal, você está brincando e de vez quando pega algo pra mordiscar; as crianças de hoje comem biscoitinhos, barrinhas doces, eu comia lasquinhas de pirarucu seco. Há vários tipos, tamanhos e nomes de peixes: pirarucu, tambaqui, jaraqui, tucunaré, que é o meu preferido – tucunaré a caranguejo, vocês conhecem?! Infelizmente não posso passar a receita, pois é algo muito intimo meu. E mais uma infinidade de nomes e peixes que não caberiam aqui.  Às vezes, é bom preparar um peixe bem caprichado, escolher os temperos, os acompanhamentos, até o modo como o peixe é cortado é importante para o preparo e a confecção do prato: tambaqui ao molho de alcaparras; pirarucu a belle meuniere; filé de aruanã ao molho de salsinha e por aí vai. Todos esses são pratos finos, elegantes e divinos, no entanto um jaraqui frito, acompanhado apenas de farinha, limão e pimenta tem o seu valor. E o que dizer de uma caldeirada de sardinha?! Há poucos dias eu fiz, foi a primeira vez que comi caldeirada de sardinha. Há alguns anos atrás eu presenciei o Luiz Bacellar pedir em uma peixaria uma caldeirada de sardinha, eu fiquei apavorada, achava que não se comia sardinha no caldo, ele comeu. Eu lembrei-me dele e fui fazer a tal da caldeirada de sardinha e ficou muito bom; o Bacellar tinha razão, assim como sempre teve bom gosto. Ponto final.