A nova colonização
E novamente pelos portugueses... Só que desta vez é uma colonização às avessas, talvez como uma espécie de mea culpa pela morte de tantos índios. Mas vamos ser otimistas e pensar que tem muita gente interessada num mundo melhor, sobretudo interessada na sobrevivência da alma amazônica e em seu futuro humano. Os portugueses de agora vieram nos redimir e nos salvar da praga lançada pela mãe do guerreiro Ajuricaba, e nos mostrar que, tal como aconteceu com o boi morto pelo Pai Francisco que renasceu num boi de pano, a alma amazônica pode renascer no coração de sua gente.
Escrevo sobre a impressão que tive do MANAUARA SHOPPING e torço para que não seja uma precipitação da minha parte, mas aquele buritizal mantido pelo empreendimento já me deixou entusiasmado. Aliás, o negócio já começou a conquistar a gente a partir do nome escolhido, que alimenta aquela velha, mas salutar, pendenga linguística de saber se o certo é manauara ou manauense, e o Shopping já tomou partido. O meu computador, por seu turno, não marcou de vermelho (na correção automática da tela, como sendo escrito errado) nenhum dos dois termos.
O centro de compras português parece que veio para ficar e já nos conquista pela alma e pelo coração mostrando aos amazonenses seus artistas, tal como o fizeram por aqui o compositor Guto Rodrigues nos anos 80, com o projeto Nossa Música, e, mais recentemente, a Lívia Mendes e o Dr. Trigueiro, através da Fundação Villa-Lobos, com o projeto Valores da Terra.
Enquanto por aqui pela província se tenta por todas as vias catequizar o povo amazonense com as culturas europeia e americana, o shopping europeu nos indica que o grande barato do momento é o tucano de aço do Turenko Beça, são as criações inusitadas do Zeca Nazaré; bom mesmo é o livro de contos do Milton Hatoum e são os poemas preferidos do Thiago de Mello. Aliás, os dois escritores amazonenses vão ser homenageados pela Livraria Saraiva com salas que levarão seus nomes. Faço questão de destacar que a Saraiva MegaStore de Manaus é a mais bonita de todas as que eu já vi e até aplacou a minha ira pelo fechamento da nossa Biblioteca Pública Estadual, há mais de três anos. E tem mais: os espaços todos do Shopping têm motivos amazônicos, inclusive com nomes de frutas regionais como tucumã (que o meu antenado computador também não marcou de vermelho), açaí, buriti, e por aí vai, e ainda aproveitam a água da chuva, segundo ouvi dizer. Shopping sustentável, que tal?
O certo é que a nova colonização (às avessas, como já disse anteriormente) veio nos libertar de uma certa preferência pelo feio, pela mediocridade e pela ignorância, locais ou importadas; veio, finalmente, nos transportar do extrativismo da belle époque para o século 21 – sustentável, plural e solidário; veio ensinar a todos que um empreendimento luxuoso e moderno pode se harmonizar perfeitamente com a natureza e a cultura do lugar e ser ainda mais atraente; veio mostrar para o conservador empresariado local, para o Governo do Estado e para a SUFRAMA, depois de tantos anos, que a beleza existe e que jardins e árvores podem melhorar e até potencializar os investimentos comerciais e institucionais, e que a cultura tem tudo a ver com a economia, e pode produzir bons negócios e ainda despertar amor pela Cidade e pelo Estado, além de aumentar a auto-estima do povo amazonense, sem forçar a barra com campanha publicitária.
Sejam bem-vindos os portugueses e que nos colonizem novamente e ajudem a nos livrar dos nossos locais, nacionais e internacionais inimigos da floresta, da alma e da cultura amazônicas.