Amigos do Fingidor

sexta-feira, 17 de abril de 2009

A propósito de uma eleição
Benayas Inácio Pereira
Cardeal de Richelieu (1585-1642), fundador da Academia Francesa, modelo da Academia Amazonense de Letras.
Quadro de Philippe Champaigne (1602-1674).

Abril de 2009. Depois de uma longa, lenta e acirrada batalha de bastidores, aconteceu a tão esperada eleição na Academia Amazonense de Letras. A vaga deixada pelo acadêmico Jefferson Carpinteiro Péres finalmente está preenchida.

De um cantinho solitário e estratégico de Manaus, acompanhei pari passo a marcha da apuração. Para falar a verdade, esta é a primeira vez que sigo mais atentamente uma eleição de academia. Antes eu tinha uma ideia errônea de como eram feitas as eleições acadêmicas. Achava eu que, para ocupar uma cadeira, o candidato deveria ter toda a sua vida dedicada exclusivamente em prol do cargo que almeja, uma vez que, após décadas de estudos laboriosos e de muito empenho, julga-se finalmente merecedor desse prêmio tão ambicionado.

Nesse caso, um médico deveria se candidatar a uma cadeira na Academia de Medicina, o açougueiro, na Academia de Carnes e Afins, o gari, na Academia dos Varredores de Rua, e assim por diante.

Eu tiro essa rápida conclusão tendo como espelho a Academia Brasileira de Letras. Desde a posse de Austregésilo de Athayde na presidência na casa de Machado, e mesmo antes, eu jamais soube de qualquer candidato que tenha sido eleito, não fosse realmente um intelectual. São poetas, contistas, cronistas, romancistas, enfim, escritores que fazem uso das letras, menos para sobreviver, mas sim, para divulgar obras que poderão até mudar os conceitos e destinos da humanidade. Quer dizer, pelo menos, devia ser assim, ora bolas. Partindo desta premissa, a mim, a eleição na Academia Amazonense de Letras desviou-e para caminhos estranhos e um tanto nebulosos, não condizentes aos ideais dessa entidade fundada há mais de noventa anos.

Nos últimos dias que antecederam a votação final, o clima visto pelo meu ângulo privilegiado de simples mortal me pareceu uma simples mescla de influências políticas com BBB (lado A e lado B). Políticas, por saber da vontade declaradamente obsessiva de vitória por parte de um deles. Minha formação pessoal não permite omitir minha opinião de que sempre deverá haver respeito pelo adversário, em qualquer circunstância. Em razão disto, confesso-me frustrado com tudo o que aconteceu.

É lógico que ambos os candidatos são extremamente ilibados, nada se podendo dizer sobre a vida pessoal de cada um deles e tampouco pelos relevantes serviços prestados à população amazonense, sendo, portanto, merecedores de imortalidade acadêmica. O processo eleitoral em si é que deixou a desejar. Corridas atrás de votos e divergências de toda a ordem marcaram de maneira, digamos, não muito ética, o andamento eleitoral.

Brevemente teremos nova eleição na Academia Amazonense de Letras. Uma pergunta grita silenciosa no éter. O que acontecerá? Os enganos cometidos nesta eleição deste cinzento abril se repetirão, ou servirá de lição para evitar novos erros? A incógnita, com certeza, permanecerá até lá.

Longe de tudo e de todos, durante uma noite insone, na minha condição de leigo, sonhei que, ao abrir o livro da Academia, logo após o resultado que apontava o novo imortal, e onde seriam assinados os nomes dos acadêmicos presentes, algo caiu bem em cima da página. Todos olharam para os céus, porém, não havia sequer uma ave.

Na verdade tinha sido mesmo um triste e solitário borrão de tinta que, inadvertidamente, tombou enodoando esta página que tinha como único objetivo enriquecer ainda mais a história daquela egrégia Academia. Que pena!