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alheio aos carros, que corriam no asfalto, o homem atravessou a pista, como se comandasse um pelotão de fuzilamento. na calçada, gritou algo indecifrável, agachou-se e, com o paralelepípedo, abriu ao meio o ventre do monstro.
olhou as mãos ensanguentadas. o sangue escorria-lhe pelos braços, ensopava-lhe a blusa e a calça esfarrapadas. mas aos seus pés o monstro tombara morto. deu urras de viva a liberdade. não precisava mais da arma, a pedra rolou na calçada, e foi atingir o cão sonolento, na porta do edifício. grito. vozes. ruídos.
no meio da praça abandonada, ele cruzou os braços, retesou os músculos, e permaneceu, como o velho busto do herói da pátria, imóvel e indiferente, ao sol, e à chuva, que logo começou a cair.
(Adrino Aragão)