Zemaria Pinto
Ana
Ana devia ter o triplo
do meu tempo de vida, o que é uma eternidade quando se tem sete anos. Ana era meiga,
embora rigorosa; graciosa, ainda que circunspecta; delicada, mas severa; e carinhosa
sempre. Impossível não levá-la comigo em meus pensamentos, quando acabava a
aula, desejando que um novo dia amanhecesse para encontrá-la de novo, naquela
rotina entre o mormaço e o azul. Quando soube que eu mudaria de escola, ela
abraçou-me e me beijou o rosto com ternura, desejando-me felicidades. Na hora,
apenas engasguei. No caminho de volta para casa, chorei a separação,
transbordando uma tristeza que me acompanha até estes dias sombrios, quando não
me restam mais que as lembranças por companhia. Branca, magra, os cabelos lisos
levemente castanhos, encontrei-a muitos anos depois como padrão de heroína
romântica: todas elas, em todas as épocas, tinham os mesmo traços gentis e
senhoriais, o mesmo porte aristocrático de Ana. Quando soube de sua morte
precoce, eu já adolescido, não pude evitar um sentimento de perda por alguém a
quem um dia amei. E chorei por Ana, mais uma vez.