Amigos do Fingidor

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Você e eu


Letícia Cardoso

 

Você e eu estávamos juntos. Caminhávamos juntos. Eu lhe segurava pela cintura, você abraçava meu ombro. Éramos um só corpo, uma só respiração. Andávamos no mesmo passo, pensávamos as mesmas coisas, nem falávamos.

Agora eu estou deste lado e você me olha daí. Não há uma ponte ou uma barreira. Não há nada visível. Mas ainda assim parece que há um abismo nesses escassos metros que nos separam. E eu me pergunto: por quê?

Por que seus lábios não estão mais nos meus? Por que sua pele não está sobre a minha? Por que eu não lhe sinto quando lhe toco? Por que você não me toca e não me sente?

Não me diga aquelas palavras. Não diga, pois elas machucam. Se for para dizê-las, eu prefiro estar no silêncio. Mergulharei na escuridão dos seus olhos. Eu estou mergulhando neste momento.

Não quero saber o motivo que nos trouxe aqui tão longe. Eu quero esquecê-lo. Se você tem a chave deste lugar, por favor, nos tire daqui. Vamos voltar para o ponto antes de tudo isso, antes de toda essa bagunça. Só não tente me dizer aquelas palavras que machucam, eu não quero ouvi-las.

Entenda, se você as disser, você me quebra. Você me quebra, amor.

Estou tão machucado, tão envergonhado. Tenho andado por dias, e sinto como se estivesse em círculos, mas não encontro a solução para nós. Você a tem?

Meu amor, por que você não me olha nos olhos? Mas se for para receber aquele olhar vazio, por favor, continue sem olhar para mim. Eu não posso suportar mais aquilo.

Eu acho que não estou suportando isso. Eu sinto que... Eu sinto que meu ar se esvai, que em minhas pernas não há mais forças. Eu estou de joelhos agora.

Eu estou de joelhos agora. E de onde estou eu lhe vejo. E de onde você está você poderia me ver, bastava um movimento seu. Eu estou esperando, eu estou esperando por ele.

Eu sigo aqui esperando por uma resposta sua. E os carros estão passando e a velocidade deles é como um borrão. A vida para mim é só um borrão agora.

Eu ainda estou aqui. Estou esperando por você. Meu corpo está frio pela chuva que cai desde o início da noite. Você já saiu da cafeteria e subiu para o nosso apartamento, ou melhor, o seu. Eu não consigo mais me acostumar com a ideia de que suas coisas são apenas suas, minhas coisas não são mais suas, você disse naquele dia. Se nada mais que é meu lhe pertence, então não há porque eu ter algum bem. Você é a minha maior razão.

Eu estou só aqui. Eu estou só aqui e sigo lhe esperando.

Meu amor, eu não sei quanto tempo mais eu tenho aqui. Mas o tempo da minha alma é todo seu. Venha me visitar.

Já faz alguns dias que estou nessa enfermaria, foi o resultado da chuva daquele dia e da minha alimentação irregular, mas eu não via mais o porquê de comer, seguir uma dieta... Você tinha razão, eu nunca cuidei muito bem de mim.

Amor, estou tão feliz que enfim você veio. Seus olhos, eles estão quentes e olham para mim. Eu já disse o quanto eu amo seus olhos? Esse tom verde-cinza que tanto me hipnotizaram, por quantas vezes eu me perdi neles? Agora eu me pergunto, sem querer saber da resposta. Eu poderia passar minha vida toda a admirá-los. Eu poderia ter feito isso, sem dúvida.

Não chore, meu amor, não chore por mim. Eu te perdoo. Você veio no momento certo, e eu não falo de hoje. Eu falo da primeira vez que nos vimos, e você me deu o primeiro sorriso. Hoje, eu só preciso que você me toque. Oh, assim mesmo como você está fazendo. Eu estou lhe tocando também, querida, saiba disso. Um último pedido? Queria que você sentisse meus dedos que deslizam agora sobre sua face.

Estou tão feliz porque você veio, meu amor. Estão me chamando agora. Eu tive uma vida inteira esperando por você, e eu estarei esperando por você aqui também.

– Espere por mim, meu amor.
 
 
Letícia Cardoso, estudante de Letras da UEA, tem 20 anos. A literatura feita no Amazonas se renova.
Letícia Cardoso publicará seus contos e crônicas neste espaço, na segunda e na quarta segunda-feira de cada mês.