David Almeida
Num sistema extremamente
capitalista, injusto – causador de desconforto para a maioria da população –
oportunamente, tudo vira produto, e enche os bolsos daqueles que têm o capital
nas mãos. Portanto, o dia dos mortos fomentou um mercado bem vivo, para os
“vivos”. Produtos de todas as espécies foram vendidos nos cemitérios. Os camelôs
e não camelôs se aproveitaram do momento para faturar um pouco mais, e
complementar a sua renda, na corrida pela sobrevivência. É “O Dia dos Mortos
bem Vividos”.
As velas, que por
muitos séculos eram consideradas de luxo na Europa, nesse dia são encontradas
de todo o preço e em qualquer quantidade. Essa fonte luz é, na realidade, a luz
para todos, pois está a todo alcance: pobres, ricos e remediados, nesse
momento, tornam-se iguais e rezam por sobre os túmulos de seus entes queridos,
na claridade dessa efêmera chama – vale ressaltar, que a diferença existe
somente na ostentação dos túmulos.
Depois vem as flores,
que perfumam ou não, e dão um colorido todo especial a esse dia: coroa de
flores, grinaldas, flores de papel, flores de plástico, flores natural... Elas
simbolizam o amor, o carinho e a saudade dos vivos pelos seus mortos, é um
gesto fraterno de gratidão, que, emocionalmente, extravasa do coração. É um dia
– para alguns – aliviarem o peso da alma.
A fé, de certa forma,
vira produto também, ninguém escapa de uma cantada dos evangélicos, eles são
muitos, e oferecem aos visitantes copos com água, santinhos, querendo a todo
custo, que você aceite Cristo no coração, mesmo que já tenha aceitado, e, em
contrapartida, lhes oferecem o paraíso, e, consequentemente, a salvação. A caça
às almas penadas é implacável, não da para fugir.
A religião Católica,
também, não fica por baixo e protagoniza uma missa em frente ao Cemitério São
João Batista, ministrada pelo bispo da capital Amazonense. Os católicos se
emocionam, choram, rezam e cantam hinos de louvor aos céus, por seus mortos... “segura
na mão de Deus, segura na mão de Deus”.
Tudo tem para vender
nesse dia, e não é exagero: na questão gastronômica, o primeiro do cardápio é o
mais que famoso “churrasquinho de gato”, depois vem bodó assado, jaraqui e pacu
frito, bife do “olhão”, refrigerante etc.
Bijuteria, imagens de santo, rosário, CD pirata e muito mais...De vez em
quando, você até escuta o subindo pelas paredes do Príncipe do Brega, Nunes
Filho. E pra finalizar, se os fieis quiserem – depois de terem se emocionado
com seus parentes que estão do outro lado do mundo – podem cair na realidade, e
ainda levar, também, uma pizza pra casa, porque religião e pizza é uma
coligação partidária perfeita. Na sequencia, como estamos no final do ano, só
pra lembrar de acontecimentos na capital federal, um “panetonezinho” vai bem,
também, “né mermo”?
E nessa romaria toda, o
dia dos mortos é bem-vindo para os muitos dias dos “vivos.” É o dia dos mortos
bem vividos.
Entorno do cemitério de São João Batista, no último dia 2 de novembro. Foto: David Almeida. |