Amigos do Fingidor

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Lábios que beijei 10



Zemaria Pinto
Célia


Célia tinha um ar esquisito que hoje identifico com sexo – Célia transpirava sensualidade: os olhos oblíquos, mas não de cigana, de cabocla; os lábios cheios, levemente entreabertos; os seios túmidos, revelando-se sob o vestido de chita. E as coxas. Se Deus fosse dado a coxas, aquelas seriam a sua perfeição. Eu desejei Célia como desejava manga espada ou jaca da bahia – um desejo úmido e cheio de cheiros. Célia perturbou-me os sentidos por muito tempo. Passava pelo seu quintal-jardim várias vezes ao dia, para vê-la e adivinhá-la os odores e comê-la com meus olhos já míopes e, sobretudo, desejá-la a distância. Lembro-me de Célia como num quadro de Boucher: a cabocla balançando, quase alçando voo, num jardim tropical. Em vez de ceroulas, coxas. As coxas de Deus.