Letícia
Cardoso
Compras.
Ninguém sabe o que isso pode nos trazer até o momento em que nós temos que sair
de casa para fazê-las. Pode acontecer que numa dessas idas ao supermercado,
você tenha uma crise de timidez. E não digo isso pelo seu possível travamento
diante da caixa, que não respondeu à sua saudação, ou então por aqueles 5
minutos que você perde tentando chamar o senhor que trabalha no açougue (e a
força que faz para se manter firme em sua missão e não aceitar a primeira carne
que ele lhe oferece). Não. Nesse tipo de atividade social, e por que não de
sobrevivência, há grandes chances de você encontrar alguém conhecido, surgindo
então aquela inquietação sobre como agir diante dessa situação. Pois, para o
tímido, acontecimentos desse tipo significam que muita coisa pode dar errada
(para ele) como frustações (consigo) e lágrimas por causa de sua
(incontrolável) introspecção.
Sabe
aquela sensação que dá quando você sente que algo saiu do eixo? Realmente, eu
não sei lidar com esse tipo de situação. Você pode estar pensando que eu estou
fazendo uma tempestade no copo d’água. Está bem, confesso que é mais ou menos
isso que você pensa, meu caro leitor. Mas, se posso ser honesta, detesto quando
encontro pessoas fora do ambiente que deveria encontrá-las. Entendeu? Deixe-me explicar
melhor.
Estava
no supermercado outro dia quando me dei conta que tinha passado os últimos
quinze minutos tentando escolher qual marca de extrato de tomate compraria.
Bem, isso foi nos cinco minutos iniciais. Nos outros dez minutos eu me dediquei
no árduo trabalho de descobrir o porquê de um elefante ser o símbolo de uma
marca de extrato de tomate. Elefantes gostam de tomate? Até então eu só
imaginava que eles gostassem de amendoins e tivessem pavor de ratos. Ok,
perdemos o foco, mas em que momento da minha longa vida como leitora de gibis
do Maurício de Sousa eu perdi o Jotalhão dizendo que gosta de tomates?
Por
mim, não há problemas, uma vez que amo massas com bastante molho. Se eu
soubesse que ele gostava disso também, talvez ele tivesse sido uma espécie de
herói para mim. E aí então eu não ficaria com vergonha alheia por todas às
vezes que a Rita Najura tentou conquistá-lo. Sério, gente, uma formiga e um
elefante? Como? Percebam que mudei de foco outra vez. Se eu estivesse
concentrada na minha missão de fazer compras naquela manhã teria percebido as
pessoas que andavam em minha direção. Oh, não! Gente conhecida (sorrindo para
você) com pessoas não conhecidas a menos de 5m agora: fuja, tímido, fuja!
Que
fique claro desde agora: não são as pessoas que encontro que me fazem
desconfortáveis. Não, geralmente não. É o embaraço da situação. Estou dando
muitas voltas para explicar? Serei objetiva, então. É que eu nunca sei o modo
como tenho que me comportar!
Você
me diz agora: Letícia, aja com naturalidade. Você conhece a pessoa e ela está
vindo te cumprimentar, qual o problema? A minha grande agitação é: primeiro,
não saber como saudar a pessoa: Talvez um “Olá”, pode parecer forçado; um “Oi”
pode sair como: “detestei te ver por aqui”; Quem sabe um “Alô”?. Cara, ninguém
deve fazer essa saudação desde o fim da década de 50! Segundo, eu não sei se
devo abraçar, estender a mão, pior: os beijos! São dois ou apenas um? E por
qual lado começa? Eu vou para direita ou para esquerda? E se a pessoa for para
o mesmo lado que eu? Jesus, quanta vergonha! Terceiro: se ainda houver crianças
e outras pessoas acompanhando o conhecido, o que fazer? Saudá-los com um aceno
e beijar a criança? Ou saudar a criança com um sorriso (que, acredite, será
incrivelmente assustador devido ao seu estado de
espírito-pré-infarto-a-qualquer-momento). Droga! Têm crianças que adoram ser
esnobes ou ainda fazer cara de Pit Bull, e mesmo sabendo que são apenas
Chihuahuas, você sente medo e desconforto com elas.
É
por causa de situações como essas que pessoas como eu são tachadas de
antissociais. Mas na verdade não são. Nós somos pessoas boas, acreditem. Nosso
único problema é a ansiedade e o nervosismo que nos assolam durante esses
momentos sociais. Nós tímidos temos medo de parecer ridículos aos olhos dos
outros. É muito fácil nos desestabilizar. Basta um comentário dúbio a respeito,
por exemplo, da nossa aparente falta de iniciativa para conversar. Coisas do
tipo: “O gato comeu sua língua”, machucam. Você já pensou se um gato realmente
tivesse comido? E por que diabos, gatos comeriam línguas? Esse é mais uma
daquelas coisas insensatas tais como elefantes que gostam de tomates!
Quando
o casal se aproximou de mim e soltou um melódico “Olá, Lelê! Que bom te
ver!”, seguido de um abraço, eu até que relaxei, mas como a cara ainda não
era das melhores, eles logo perguntaram se eu estava bem. Na verdade, na minha
mente passava aquela velha guerra sobre maneiras de saudar as pessoas,
sobretudo, aquela vontadezinha de saber como abraçar alguém sem travar durante
o processo. Mas essa história eu deixo para próxima.