Amigos do Fingidor

sexta-feira, 11 de março de 2016

Discurso de posse no IGHA – 2/3



Zemaria Pinto

Em 1918, Nunes Pereira, aos 24 anos, torna-se o fundador da cadeira de número 23 da Sociedade Amazonense de Homens de Letras, precursora da Academia Amazonense de Letras. Por uma dessas coincidências do destino, a cadeira 23, do poeta Cruz e Sousa, que já fora ocupada pelo amigo Alencar e Silva, é hoje ocupada pelo amigo Júlio Antônio Lopes. 
No ano anterior, em março, dera-se a fundação do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas. Apesar de várias informações desencontradas, Nunes Pereira jamais foi associado ao IGHA, uma lacuna que se corrige hoje, vinculando definitivamente o nome do grande cientista e escritor à centenária Casa de Bernardo Ramos.
Voltando a 1918, ele casa-se com Maria Rodrigues Ribeiro, filha do coronel José Alexandre Ribeiro, de Parintins. Nesse meio tempo, o funcionário público Nunes Pereira, que por formação era técnico em Veterinária, foi incumbido pelo governador Pedro de Alcântara Bacelar de uma missão que poderia ser o estopim de seu interesse pela causa indígena:
Percorrer os campos naturais do Amazonas e do Território do Rio Branco para fazer um extenso relatório sobre o potencial pastoril dessas regiões, convivendo entre os Macuxi, os Arecuna, os Taulipangue e os Ingarikó.

Leitor ávido e voraz, Nunes Pereira formou cinco bibliotecas ao longo da vida. Poliglota, dominava o francês, o inglês, o italiano, o alemão e o espanhol, além do nheengatu. Vale ressaltar uma característica recorrente na sua obra: a absoluta transparência intelectual. Além da bibliografia convencional, ele, no próprio texto, explica detalhadamente como chegou a cada informação ou conclusão – desde as leituras que lhe serviram de base até as mais triviais conversas com seus guias e narradores. Também não poupa citações e referências, especialmente as de cunho literário. Sua fama de boêmio é incompatível com sua disciplina de leitor e de escritor.
Admirador de São Francisco de Assis, Nunes declara-se crente em um Deus “um pouco indígena, um pouco católico”, ressaltando sua condição de maçom. Do seu Arquivo nos anais da Biblioteca Nacional consta um Passaporte emitido pela Grande Loja do Estado do Pará, em outubro de 1954, atestando sua filiação ativa à Loja Maçônica Renascença, de Belém.
Em 1944, juntamente com Geraldo Pinheiro, André Araújo e Mário Ypiranga Monteiro, Nunes Pereira funda o Instituto de Etnologia e Sociologia do Amazonas – do qual foi o primeiro e parece que único presidente. Nos referidos anais, há vários documentos dando conta das atividades do Instituto, inclusive do lendário caso envolvendo os despojos de Koch-Grünberg. 
Em outubro de 1973, recebe o título de cidadão de Manaus, concedido pela Câmara Municipal, proposição do vereador Fábio Lucena.
Em entrevista, aos 83 anos, confessou duas frustrações: “não saber música, e não saber desenho”.

Num dia como hoje, 26 de fevereiro, mas de 1985, há exatos 31 anos, falecia, no Rio de Janeiro, Manoel Nunes Pereira – cientista, poeta e contador de estórias.